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quinta-feira, 8 de fevereiro de 2024

MULHER CHORANDO

 

MULHER CHORANDO


Em Mulher Chorando (1937), de Pablo Picasso, uma mulher, em que o elemento colorido é o chapéu, sugerindo que foi retratada depois de voltar dum convívio feliz, como uma festa, apresenta o conjunto rosto e mãos numa crispação atroz, de um sofrimento extraordinário, surpreendida, certamente, após a felicidade anterior, por um acontecimento terrível, admite-se de morte, da esfera afetiva mais íntima: num desdobramento emocional entre o festivo e o mais-que-dramático maximizado pela figura cubista sobre um fundo de sala espacial, não cubista. O rosto e as mãos, principalmente, são uma planificação geométrica contra o fundo, da parede do espaço em que se encontra, muito real: num conjunto dividido entre o cubismo extraordinariamente expressivo e o realismo inexpressivo. Em Mulher Chorando o cubismo de Picasso centra-se nas mãos e no rosto envolvidos num dramatismo extremo: o expressionismo emocional, ou sensorial, domina sobre o expressionismo geométrico, do cubismo em si. O cabelo é real: a transição na cabeça, do real, do cabelo, para o cubista emotivo, do rosto e das mãos, amplia o emocional sobre o geométrico, ou anula-o. Na síntese dessa anulação o quadro retrata, admito, o sofrimento ancestral feminino sobre o sofrimento da mulher retratada. Em Mulher Chorando não está representado o sofrimento duma mulher e sim o sofrimento de todas as mulheres.

Mulher Chorando (um conjunto de quadros) foi pintado no tempo da guerra civil espanhola (1936 / 1939), da segunda guerra mundial e do bombardeamento de Guernica. Foi, muito possivelmente, o cruzamento das atrocidades excessivas da sua atualidade, em pleno século XX e na era científica e académica, que conduziu Picasso a ampliar o expressionismo da dor afetiva feminina causada pela guerra para a dor da mulher ancestralmente sofrida.

Em primeiro lugar poderíamos interpretar o sofrimento duma mulher que acabou de saber que o filho, militar, morreu na guerra. Mas estaria errado porque a mulher que tem um filho na guerra não vai a uma festa e o seu ornamento é festivo: veio, efetivamente, duma festa. Em segundo lugar poderíamos interpretar que retrata o sofrimento duma mulher saída duma festa e que soube da morte, não na guerra, de um ente muito querido: mas mesmo esta interpretação não seria fiável porque em tempo de guerra o homem não organiza festas ou, antes, o autor coerente da representação artística não as sugere. E Picasso foi um pintor coerente. Resta-nos admitir que a mulher é uma mulher intemporal que representa o sofrimento afetivo sobre os outros sofrimentos: ou o sofrimento, centrado na família, de todas as mulheres. No expressionismo de Mulher Chorando sobressai a dor contrária ao afeto familiar, da Famíçia: a base indiscutível da sociedade humana.

No princípio, na Família Embrionária, a família era a mais simples: mãe, pai e filho. Contudo, como na conceção de qualquer ser ficam a mãe, o pai e o filho a família original, da exclusividade humana, exigiu uma força agregadora entre os três elementos: o Afeto. O afeto maternal é ancestral e sempre agregou, antes da Família, a mãe ao filho até à idade de desmamentação, ou de emancipação da cria. Depois, quando o progenitor reconheceu a cria como sua e permaneceu junto dela e da mãe nasceu o afeto paterno. Mas os afetos materno e paterno só se transformaram em afetos familiares quando a eles se associou o afeto da cria no prolongamento da vida a três depois da desmamentação: e isso ocorreu quando a cria reconheceu cognitivamente a mãe e o pai como seus progenitores. Foi essa exigência cognitiva, na transformação cerebral da criança primitiva, que conduziu à vivência triangular da Família Embrionária.

No afeto a três no bipedismo anterior ao Bipedismo Absoluto, quando a mãe prenha desiquilibrada para a frente pela deslocação do centro de gravidade voltava ao estado quadrúpede provocando o medo do pai, a insegurança nuclear negava a segurança afetiva exigida pela Família: ao Afeto somou-se a Segurança para que o agrupamento selvagem evoluísse para o civilizado. O meu estudo sobre a evolução partindo do paralelismo entre a evolução infantil e a evolução do homem conduziu-me à distância de 1,5097X10^6 anos (86,6231 graus) para a Família Embrionária e 552 882 anos (88,7747 graus) para a Família na aproximação da verticalidade (90 graus) e da Civilização. E a evolução da Segurança, da atração maior do Afeto, foi do esforço martirizado da mulher: porque foi ela que permaneceu no lar quando o homem saiu para a caça e para a guerra. E o sofrimento extremo de Mulher Chorando, de Pablo Picasso, representará o sofrimento feminino acumulado desde a origem da Família e da consolidação do Afeto.

No cubismo de Mulher Chorando desdobram-se o geométrico com o emocional do representado: a mulher afetiva e o sofrimento histórico associado. Com o emocional dominando sobre o geométrico. No Cubismo de Picasso, distinto dos cubismos analítico e sintético, a emocão adquire forma geométrica sobre a geometria formal.

https://evolucaoarseniorosa.blogspot.com/2024/02/mulher-chorando.html

Arsénio Rosa

2024