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quarta-feira, 28 de maio de 2025

ESTÉTICA IX X

 IX O PONTO NÚMERO 9 DA ESTÉTICA. A VANGUARDA I DA ARTE. ANDAMENTO DA ARTE E DA ESTÉTICA ENTRE 1848 E1900

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Em 1848 um grupo de pintores instalou-se numa pequena vila dos arredores de Paris, Barbizon. Tinham por objetivo romper com a arte clássica e académica e manifestar o seu amor pela Natureza pintando-a diretamente. A atração pela Natureza inspirara-se nas paisagens de Jonh Constable, pintor romântico da variante naturalista (a outra variante romântica foi a libertadora, ou revolucionária, exemplificada em A Liberdade Guiando o Povo, de Eugène Delacroix). 1) Se a arte clássica e académica exigia um esboço prévio e a pintura executada a partir dele no estúdio os pintores de Barbizon pintaram sem esboço, diretamente, no Bosque de Fontainebleau. 2) se a arte clássica e académica levava para o exterior o bloco e o lápis para a execução do e prévio os Pintores de Barbizon passaram a levar o cavalete, as tintas e os pincéis. 3) Se a arte académica e clássica exigia a mistura das tintas na paleta os Pintores de Barbizon desobedeciam a essa regra misturarando-as diretamente na tela. 4) As pinturas de Barbizon privilegiavam a Natureza, contra o uso académico e clássico, onde ela era invariavelmente o plano de fundo, no retrato, nas cenas bíblicas, históricas, mitológicas e de género. 5) A Escola de Barbizon rompeu com o conceito clássico de Escola. A unificação da neocrítica primária com a defesa da Natureza, a negação da arte clássica e a escola livre criaram a Vanguarda I em 1848 na Escola de Barbizon. (VI)

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Em 1848, na convergência da neocrítica primária e da negação do artificial, no ponto 9 da Estética, nasceu a Vanguarda I: como o que vai à frente na Arte.  A Arte, e a Estética, em 1848, foi ao encontro da razão iluminista e moderna centrada no Contrato Social: tanto Hobbes, como Locke, como Rousseau, defenderam a lei humana como a continuidade da lei natural; e em Rousseau na Escola, a base do desenvolvimento humano, do Contrato Social e da democracia, Emílio aprende naturalmente estimulado para a aprendizagem.

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A pintura da Escola de Barbizon foi inspirada na pintura de John Constable (1776/1837). John Constable viveu em pleno período da Revolução Industrial e urbana (1760/1830) e em vez de enfatizar a paisagem urbana, da onda corrente, enfatizou a paisagem natural; os pintores de Barbizon, já em plena era moderna, com os grandes centros industriais e urbanos e com a febre romântica de liberdade pintaram o Bosque de Fontainbleau em vez de Paris, efervescente de cor, de contraste e de gente. Os Pintores de Barbizon, franceses e estrangeiros atraídos pela febre da cidade da Arte, Paris, saíram para os arredores por uma atração maior, a Natureza, e o bosque de Fontainebleau, na vila de Barbizon. Se John Constable, um só pintor, sentiu o encanto natural na ascensão social os pintores de Barbizon, muitos, uma Escola, fixaram esse encanto determinando a Natureza sobre a Natureza Humana: na Arte e na Estética. Com a inspiração direta na Natureza a Natureza sobrepôs-se à Natureza Humana na representação artística. Essa sobreposição contrariou o domínio da Natureza Humana sobre a Natureza vinda do pensamento clássico e da arte associada. Essa contrariação foi outro fator determinante da Vanguarda I: quando a ideia de Vanguarda depende de fatores sensitivos gerais, do andamento da Arte e da Estética, e não de pormenores localizados, práticos, de um artista ou de um movimento, ou ideológicos, de um crítico.

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Em 1848, com a Escola de Barbizon, ocorreu o ponto número 9 da linha da Estética pela inversão da dominante sensitiva na Arte: antes o pensamento partia do domínio do homem (criado por Deus e por ele protegido: pensamento dedutivo) sobre o que o rodeava; depois o pensamento partiu do domínio da Natureza sobre o homem (que obedece racionalmente às suas leis: pensamento indutivo vindo do iluminismo). Com essa transformação fundamental, por ser do pensamento, ideológica, sensitiva e da perceção (variantes que vinham desde Platão), nasceu um novo rumo na linha da Estética. E associaram-se mais dois fatores essenciais: 1) Com a elevação da Natureza à Natureza Humana a Arte negou, implicitamente, o impacto negativo da atividade industrial no Ambiente; negou os efeitos negativos da evolução científica: negação essa que foi impressa no manifesto do movimento Arts & Crafts, da década de 1880, e foi transversal a muitos outros dos quase 190 movimentos da Arte Moderna; 2) Sendo a Escola de Barbizon uma escola sem regras académicas 1848 rompeu com a classificação de Baumgarten que restringia a Obra de Arte às disciplinas de Belas Artes. A importância da escola Livre contra a escola Clássica na criação da Vanguarda I está correta porque todas as transformações fundamentais da Arte Moderna, como o Impressionismo, o Cubismo, o Expressionismo e o Dadaísmo nasceram alheias ao meio académico, às Belas Artes da Estética de Baumgarten: por isso em 1848, com a Escola de Barbizon e a origem da Arte Moderna, nasceu uma nova Estética: a Estética da Arte Moderna. (EAM)

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Se antes de 1848 o pensamento era dedutivo, da dependência de Deus, o indutivo, seguinte, passou a ser da dependência da Natureza. Dependemos da Natureza e não de (D)deus. Tudo centrado no útil. No andamento humano o geral, da espécie, sobrepõe-se, incontestavelmente, ao particular. Em cada momento urge sobre a sobrevivência do indivíduo, dirigida pelos avanços científicos centrados na Medicina, a sobrevivência da espécie, centrada na defesa da Natureza contra a crise ambiental. A espécie sobrepõe-se ao indivíduo: no útil. Se (D)deus é útíl a muitos homens, de diversas religiões, na superação dos seus problemas particulares, (E)ele não é útil à espécie que tende a sufocar ambientalmente arrastando os crentes e os não crentes: também por isso, mas mais porque a Natureza é a mãe, temos a Natureza sobre deus. E a Arte, em 1848, deu o passo, da Vanguarda I e do ponto 9 da Estética, da sobreposição da Natureza a deus que se vinha desenhando desde a origem do Renascimento pelo pensamento, na literatura e na pintura, por Giotto: ela com letra grande, porque a espécie depende dela, e ele em letra pequena porque a queda no caos é indiferente a deus. E o útil, na Arte e na Estética, passou a ser genérico e não do indivíduo: por isso o Esteticismo, um movimento transversal de 1868, negou a Arte orientada por razões particulares e defendeu a Arte sintetizada na Arte, de uma só razão: que não pode ser outra senão a da Natureza sobre deus.

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A Escola Livre contra a escola tradicional foi uma crítica à direção anterior da Arte e da Estética; a negação aos métodos clássicos foi uma crítica à representação artística vinda desde a imitação de Sócrates; e a sobreposição da Natureza à Natureza Humana foi uma crítica ao homem problemático, com ele próprio e com o meio envolvente: foi uma crítica ao homem artificial. Nas três variantes temos a palavra Crítica. Na terceira é a crítica ao homem artificial: da poluição, da guerra e da desigualdade. As outras duas podem também enquadrar-se na crítica ao artificial: porque a imitação, a base da arte clássica, é uma falsificação da realidade, a forma natural representada artificialmente; e a Escola Livre é a crítica, e a fuga, pela Arte, ao aprisionamento do homem. Podemos concluir que o ponto 9 da estética e a Vanguarda I foram dirigidos pela crítica ao artificial: a crítica ao homem genérico sobre o homem individual. A crítica ancestral ao dogmático, que refreou no Neoclássico e no Romantismo, foi substituída na Arte Moderna pela Crítica ao Artificial.

 ESTUDO DOS MOVIMENTOS ARTÍSTICOS SEGUINTES A 1848 EM DIREÇÃO AO PONTO 10 DA ESTÉTICA E À VANGUARDA II DA ARTE.

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O Gosto em 1848 foi sensibilizado pela negação do artificial ou elogio da Natureza. Os pintores de Barbizon levados pelo Gosto foram para o Bosque de Fontainebleau para o representar como o viam. A Forma transitou da formas clássica, onde a Natureza era o plano de fundo, para a Forma moderna, onde a Natureza é  plano principal. Cada parte do bosque pintada representou uma Forma da Natureza marcada pela emotividade do executante. O Belo de cada obra residia na ligação emocional do Gosto à Forma. A emoção artística abandonou o impulso metafísico e libertador e fixou-se na ligação visceral do homem à Terra. Esta nova emoção orientou as pulsações iniciais da Arte Moderna. O Gosto na pintura de Barbizon foi do gosto pela pintura ao ar livre, da Natureza: livre das regras académicas, clássicas e limitadas pela Estética de Baumgarten. A Forma foi a forma da paisagem natural transmitindo as emoções da Natureza ao homem. O Belo foi o belo da Natureza sobre o belo da Natureza Humana.

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Na dispersão sensitiva, do Belo e do belo, dos diversos movimentos seguintes a 1848, quando é que o Belo passou a dominar transversalmente sobre o belo na evolução da Arte? Essa transição demarcou um segundo ponto da Estética Moderna: o ponto número 10 da linha da Estética: porque foi a reafirmação da crítica ao artificial, equivalente ao elogio da Natureza, vinda da Escola de BarbizonSe a Escola de Barbizon, individualmente, um movimento, colocou a Natureza no foco central da Arte o ponto 10 da Estética fixou essa colocação pelo apuramento coletivo seguinte a 1848. Com o ponto 10 da Estética nasceu a Vanguarda II. O Belo determinou-se efetivamente sobre o belo no Primitivismo simultâneo à Escola Moderna de Paris de 1900. Pelo estudo dos movimentos seguintes a 1848 compreendemos a conversão dada em 1900. Ocorreram cerca de 38 movimentações artísticas: movimentos, correntes, associações, clubes e secessões: a que chamo, simplificando, movimentos.

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1848: Escola de Barbizon. 1848: Ponto número 9 da Estética. 1848; Vanguarda I. 1868 Esteticismo. 1870: Arte Kitsch. 1872: Impressionismo. 1850/1900: Realismo. 1878: Cubismo Cezanniano. 1882 Arts Inchoérents. 1884: Société des Artistes Indépendants. 1885: The New English Art Club. 1885: Pós-impressionismo.1880/1900: Decadentismo. 1880/1900: Arts & Crafts. 1880/1900: Pintores de Skhagen. 1886: Simbolismo. 1886: Escola de Pont-Aven. 1886: Neo-impressionismo. 1886: Arte Naif. 1886: Pontilhismo. 1888: Sintetismo. 1888: Cloisonismo. 1890: Les Nabis. 1892: Secessão de Munique. 1892: Linked Ring. 1893: Expressionismo. 1890/1900: Arte Nova. 1890/1900: Pictorialismo. 1890/1900: Modernismo. 1896: Jugendstil. 1897: Secessão de Viena. 1898: Jovem Polónia. 1898: Secessão de Berlim. 1898: Mundo da Arte. 1899: Darmstadt. 1900: Primitivismo. 1900: Vanguarda II. 1900: ponto 10 da Estética.

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Houve movimentos insignificantes: acríticos que pouco, ou nenhum, significado tiveram no andamento da Arte. Houve movimentos com significado: que interferiram de algum modo no andamento da Arte ou que se impuseram como estilos autónomos no tempo. E houve movimentos significantes: críticos e determinantes no andamento da Arte e da Estética. Isso na relação direta com a Arte; indiretamente, em seguimento da liberdade representativa e crítica da Escola de Barbizon, ocorreu a negação (fundamental ao progresso da Estética) à arte clássica, académica e convencional: negação transversal a movimentos significantes, com significado e insignificantes que dificulta a separação dos seus níveis de importância. São exemplos as associações expositivas, como o The New English Art Club, de 1885. Exigindo a liberdade expositiva para todos não foi esteticamente crítica; mas negou, a favor do novo, a obstrução expositiva associada à arte clássica, académica e conservadora: misturando os critérios de classificação insignificante, com significado e significante.

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A Vanguarda I, associada à Escola de Barbizon, em 1848, surgiu como o que vai à frente, na Arte. Não existindo vanguardas antes a Estética como que não se definia linearmente em cada período: seguia as oscilações dos avanços clássicos. Enquanto as transformações artísticas obedeciam aos avanços técnicos e plásticos a crítica só obedecia a si mesma: como uma razão estética, ou sensitiva, subjacente a todas as transformações práticas. Na separação da Arte Moderna da Arte Clássica à Vanguarda I esteve implícita, vinda do Iluminismo, do Romantismo e, revolucionariamente, da Queda da Bastilha e da Revolução Francesa, a reivindicação da igualdade social como uma aspiração da Arte. Essa aspiração foi negada pelo Esteticismo, de 1868, embora seguisse dispersamente até 1900. Como a Estética é a disciplina da Arte a reivindicação social negada transversalmente, de modo sensorial e não plástico, pelo Esteticismo, foi excluída da Arte.

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Se a Escola de Barbizon foi um passo plástico (contrário à técnica clássica) em frente ele necessitava de um apoio ideológico, ou sensitivo: o Realismo, entre 1850 e 1900, e o Esteticismo, de 1868, criaram esse apoio de condução à Vanguarda II. As transformações clássicas eram impulsionadas pela crítica e o primeiro avanço moderno foi acompanhado do respeito pela natureza, um impulso ideológico: logo pela crítica porque ideia é crítica. Se 1848 foi o momento da transição do clássico no moderno nele o gosto transformou-se em Gosto. O gosto clássico que chegou a 1848 necessitava da ideia, da crítica, para subir a Gosto. Antes de 1848 a crítica era exclusiva da Arte enquanto a Estética se dissolvia pelas variantes das Belas Artes, sem crítica, ou com crítica; Em 1848 a Arte tornou-se crítica do artificial: como a Arte é dirigida pela Estética esta passou a ser dirigida pela crítica ao artificial. O acompanhamento das transformações práticas por transformações sensitivas ocorreu na evolução da Arte e da Estética como ocorreu na evolução do homem: a separação da linhagem humana do macaco Rhesus, há cerca de 25 milhões de anos, foi precedida pela origem da Linguagem Articulada e da distinção da comunicação antropológica da comunicação animal; a transição do quadrúpede no bípede, há cerca de 6,4 milhões de anos, foi precedida pela descoberta do Verbo essencial à conversão do Tropo na Palavra e da Linguagem Articulada na Linguagem Moderna; a transição da Barbárie na Civilização, há cerca de 8000 anos, foi acompanhada da conversão dos sinais artísticos, do segmento final da Arte Rupestre, nos signos literários e numéricos da origem da Escrita e da Matemática. A Arte Rupestre, de há cerca de 90000 anos, deu-se pela associação da verticalidade com a sensibilidade artística inicial. Como uma exigência antropológica a razão ideológica acompanhou a evolução da Vanguarda I. Seguindo essa razão ocorreram: as secessões de Berlim, de Viena e de Munique e os orientadores transversais, o Esteticismo, o Sintetismo; e o Primitivismo da origem da Escola Moderna de Paris, de 1900, da Vanguarda II da Arte e do ponto 9 da Estética.

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Todas as movimentações reivindicativas do novo contra o velho na Arte participaram na evolução artística: porque intervieram ideologicamente no andamento estético. As secessões e associações, de grupos de artistas localmente estabelecidos, derivou de movimentações gerais ou originou-as, como o  Esteticismo, o Sintetismo, o Modernismo e o Primitivismo, no sentido duma vanguarda para a seguinte. O Esteticismo, de 1868, nasceu 20 anos depois de apenas 3 movimentos, de 1848, a Escola de Barbizon, a Vanguarda I e o ponto 9 da Estética: sem pressão o Esteticismo nasceu da necessidade da Arte concentrar-se na Arte, duma Estética limpa do alheio contido na Vanguarda I. Contudo, entre 1850 e 1900, simultaneamente ao Esteticismo mas sem data de início precisa, ocorreu o Realismo.

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O Realismo foi uma orientação artística lateral a todas as transformações artísticas entre 1850 e 1900. Negou a subjetividade a favor da objetividade na Arte. Uma objetividade ativista, social e politizada vinda do Romantismo e adotada pela vanguarda I. Quis a representação fidedigna da realidade depois da primeira fotografia em 1826 (por Joseph Niépce e da primeira câmara fotográfica em 1839 (por Jacques Daguerre) com a imitação entregue à máquina fotográfica que evoluia a passos rápidos. Negou o elitismo clássico a favor do classicismo popular centrado nas exigências sociais. Por sua vez o Esteticismo, de 1868, negando tudo que era alheio à Arte, como a reivindicação social vinda da vanguarda I e do Romantismo, entrando em conflito com o Realismo durante 32 anos, defendeu a Arte sintetizada na Arte.

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A elevação da forma à Forma do Cubismo (1878: Cubismo Cezanniano antes do Cubismo de Picasso e Braque), a sintetização simbólica da Obra de Arte exigida pelo Simbolismo que levou da forma do sinal à Forma do signo, conduziu ao Sintetismo de 1888. O Sintetismo defendeu a representação reduzida ao mínimo de pormenores e foi fundamental a todo o andamento posterior, de queda da objetividade na subjetividade, ou da imitação na abstração: ou da forma plástica na Forma sensitiva, ideológica e crítica. O Cubismo e o Simbolismo foram movimentos artísticos e o Sintetismo foi uma orientação de movimentos. A seguir ao Sintetismo, ou em simultâneo porque também de 1888, surgiu o Cloisonismo, que conduziu a forma tradicional, com contornos indeléveis, com contraste claro e escuro, com profundidade, todos da aprendizagem clássica, à Forma moderna, com contornos espessos e negros, com áreas planas de cor, sem perspetiva: da arte livre e contrária à da aprendizagem académica. O Modernismo, de1890/1900, mas muito provavelmente imediatamente seguinte a 1893 de O Grito, concentrou todas as tendências orientadoras vindas do Esteticismo associando-lhes mais uma: a força expressionista de Edvard Munch. Foi a agressividade representativa do homem contra a Natureza, lateral à linha contra a agressão da guerra, de O 3 de Maio de 1808 (1814) de Francisco de Goya e de A Carga dos Marmelucos de Edouard Manet (1868), que levou da Vanguarda I à Vanguarda II e do ponto 9 ao ponto 10 da linha da Estética, em 1900.

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A Vanguarda II e o ponto 10 da Estética foram alheios à crítica à besta humana associada à guerra mas tiveram os seus alicerces na crítica ao homem artificial, alienado sob a Natureza, do Expressionismo recém-nascido e que veio dominar toda a arte futura. Com a Vanguarda II e o ponto 10, em 1900, nasceu a Escola Moderna de Paris como o campo de evolução seguinte da Arte e da Estética. Na Escola Moderna de Paris dominou a crítica ao artificial com a crítica à guerra, e à arte clássica, em estado latente, porque se vieram a manifestar depois: com o Cubismo de Picasso depois de 1907 das Demoiselles d’Avignon e do Dadaísmo de 1916; e da negação da arte retiniana de Marcel Duchamp de 1915.

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Arte não é arte. A arte é decorativa e a Arte é crítica. A Arte é da Estética, alinhada nos movimentos Significantes; e a arte é dos movimentos com significado e insignificantes, desalinhados da Estética. O Impressionismo com a impressão, ou sensibilidade, sobre o visual, e o Expressionismo, com a expressão sobre a impressão, foram críticos e alteraram o rumo da Arte e da Estética: foram significantes. A Arte Nova, um grande movimento transversal a diversas disciplinas, da beleza floral e decorativa, não foi crítico e não alterou a direção da Arte e da Estética: mas persistiu como movimento no tempo e no mundo: foi com significado. O Kitsch e o Naif  foram decorativos no ingénuo e acríticos que persistiram lateralmente à Arte e à Estética.

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 O Kitsch (1870) foi artisticamente nulo, ou insignificante; mas não foi esteticamente nulo: porque a sua génese, a não-Arte (não nos termos seguintes a 1900: de Marcel Duchamp e do Dadaísmo, mas nos termos banais, mesmo do corriqueiro sobre o ornamental) querendo passar por Arte na Escultura, originou, uns 70 anos depois, na chamada Arte Contemporânea, o Neokitsch e o Neoneokitch. O Naif (1886) foi um movimento para a análise dupla: em si a arte Naif foi da representação básica, ingénua, garrida, demasiado pormenorizada e sem criatividade artística, da paisagem popular; mas de si, da sua plasticidade, nasceu a simplicidade formal que deu origem a correntes fundamentais da Arte Moderna, como o Impressionismo, o Expressionismo e o Fauvismo, transversais ao Primitivismo da conversão da vanguarda I na Vanguarda II. O Arts & Crafts (1880/1890), reivindicativo da elevação do Artesanato a Arte, não foi um movimento esteticamente nulo: só porque alertou para o problema da poluição industrial. O primeiro alerta artístico da crise ambiental deu-se com o Arts & Crafts, na Arte Moderna, quando a denúncia da impiedade humana para com os animais se deu com Caravaggio, na Arte Clássica, no dente partido do pente de Maria Madalena, cerca de 200 anos antes: com a denúncia e o alerta na linha crítica que veio até ao presente. A defesa do Ambiente pela Arte, oficializada no segmento final da Estética na Arte Crítica de 2019, foi sinalizada no Arts & Crafts entre 1880 e 1890. O Artes Incoerentes (1882) defendendo a arte infantilizada e o mal desenhado como Arte preconizou variantes do expressionismo figurativo: como de Pablo Picasso (1907), do CoBrA (1948) e da Arte Bruta (1945) de Jean Dubufet. O Impressionismo (1872) foi um movimento fundamental porque imprimiu à Arte a impressão sobre o real; quando foi a impressão que precedeu o expressionismo, da expressão crítica, dos sentidos sobre o plástico. Paul Cezzane, com a primeira pintura do Monte de  Santa Vitória (1878), criou o Cubismo Cezanniano muito antes do Cubismo Analítico e do Cubismo Sintético de Picasso e de George Braque; Paul Gauguin (1848/1903), reduzindo a forma a áreas planas de cor delimitadas por traços espessos negros, preconizou o Sintetismo (1888) e o Cloisonismo (1888) essenciais ao andamento da Arte Moderna e da negação clássica; e o Pontilhismo (1886) de Jeorge Seurat (1859/1891) reduziu a Pintura ao sintetismo mais puro, com os pontos complementares, ou o ponto, no limite das formas geométricas fundamentais dos outros movimentos geométricos. O Cubismo Cezanniano, a pintura de Gauguim e o Pontilhismo, como alterações geométricas da realidade nascidas no Impressionismo, originaram as correntes geométricas do século XX: o Cubismo Analítico (1907), o Cubismo Sintético (1911), o Suprematismo (1916) e o Neoplasticismo (1918). A Arte Nova (1890/1900) demarcou na originalidade floral o decorativo transversal a diversas áreas estéticas e à Estética ao mesmo tempo que, sem crítica, elegeu as formas da Natureza contra as formas artificiais. O Linked Ring (1892), contrariamente ao Pictorialismo (1890/1900) que manipulava a fotografia para a elevar a Arte, defendeu a Fotografia como Arte. O Darmstadt (1899), transversal a diversas áreas incluindo a Arquitetura, preconizou a a (1919) defendendo a Arte útil, ou arte funcional, a favor da felicidade pública e contra o elitismo urbano, artístico e institucional (interesses laterais à síntese da Arte na Arte imposta pelo Esteticismo (1888) no percurso do ponto 9 para o ponto 10 da Estética).

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O Simbolismo (1886) preconizou a Arte Concetual (não do que se concebe e sim da abertura à conceção ideológica, e crítica, dos outros) do Expressionismo Abstrato: na defesa da Obra de Arte aberta ao olhar dos observadores; na exigência da subjetividade na análise da Obra de Arte; na defesa da dispersão analítica da Obra de Arte conforme a dispersão analítica dos observadores; e na defesa da dispersão analítica da Obra de Arte pela sua dispersão simbólica, do seu sinal dinâmico, não estático, ou signo. O Les Nabis (1890) seguiu todas as exigências modernas contrárias ao conservadorismo e defendeu a Arte como A razão da busca humana. Jovem Polónia (1898), em conformidade, defendeu a Arte como valor superior da transformação humana. A Société des Artists Indénpendants (1884) negou a Estética clássica, de Baumgarten, a favor de uma nova Estética: na linha da crítica da Arte Moderna vinda de 1848. Defendeu, pela liberdade expositiva, a exibição artística sem júris de seleção e sem prémios; pormenor só comum ao Versatilismo (2008). O clube expositivo The New English Art Club (1885) (que chegou até hoje como The London Group) foi contrário ao conservadorismo que só expunha a sua elite. A negação do conservadorismo artístico, clássico e académico, contrário à Estética, desse clube, da maioria dos movimentos e da totalidade das tendências, adquiriu a sua forma máxima nas secessões: três no século XIX e duas no século XX. A Secessão de Munique (1892), de Viena (1897) e de Berlim (1898), liderando as reivindicações ideológicas fundamentais ao progresso artístico negaram a arte clássica, académica e instituída, afirmando o novo contra o velho no segmento final da transição para a vanguarda II. A força sensitiva das secessões jogou com o Modernismo (1890/1900) na defesa da subjetivação da realidade contra a imitação clássica e académica: e na convergência na escola Moderna de Paris de 1900. O  Pós-impressionismo (1880/1900) negou a emotividade total do Impreessionismo e trocou as cenas da Natureza pelas sociais. O Neo-impressionismo (1886) seguiu o Pós-impressionismo trocando as cenas sociais pelas do convívio boémio e seguiu os métodos de Paul Gauguin. O Decadentismo (1890/190) foi um movimento sobretudo literário. Na pintura usava uma simbologia clássica transparecendo inquietação, pesar, distúrbio emocional, tristeza e ceticismo, numa crítica aos valores sociais vigentes. Negava a abertura concetual simbolista da Obra de Arte defendendo-a como imagem exclusiva de quem a produziu. Os Pintores de Skagen (1890/1900) seguiram os de Barbizon simpatizando com a pintura ao ar livre. A Escola de Pont-Aven (1886) foi um marco fundamental no avanço da Arte Moderna. Foi uma colónia artística espontânea em Pont-Aven, Bretanha, França, de jovens artistas simpatizantes sobretudo do Impressionismo em cenas do romantismo rural. A colónia artística de Pont-Aven, depois da Escola de Barbizon,  marcou o oposto da escola académica a que a maioria esmagadora dos movimentos se opuseram. O Jugendstil (1896) foi um movimento sobretudo tipográfico de tendência revolucionária. Adaptou os caracteres tipográficos à Arte Nova, ou inversamente, indo do decorativo ao agressivo, da forma e da cor, ao sabor da temática a transmitir. O Mundo da Arte (1898) foi um movimento que à imagem de todos os movimentos russos posteriores quis adaptar as tendências principais da arte ocidental à sua arte tradicional: do popular, do folclore e dos ícones. Negou o conservadorismo vigente nas artes.      

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Todas as exigências e adiantamentos da Arte Moderna nesse período mostram que a sua evolução não foi linear: o caso máximo foi o nascimento do Expressionismo por um caso isolado na Pintura: O Grito, de Edvard Munch, de 1893, 6 anos antes da vanguarda II, 17 anos antes do expressionismo cinematográfico (1910) e 27 anos antes do Expressionismo Alemão (1920). Da Vanguarda I para a Vanguarda II o que a Arte apurou foi o que foi em frente; da Vanguarda I para a Vanguarda II o que a Estética apurou foi a arte crítica: da crítica de O Grito de Munch depois da crítica à poluição industrial do Art & Crafts e da crítica naturalista de Barbizon, da expressão sensitiva sobrepondo-se à impressão impressionista.

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O Modernismo geométrico negou a representação clássica da sombra, profundidade e perspetiva reduzindo-os, sensitivamente, ao sintetismo da cor, linha e planificação. Embora O Grito de Munch não seja uma planificação ela carece das regras tradicionais de perspetiva e profundidade: não obedece por completo ao modernismo geométrico mas aproxima-se muito dele. As figuras, a principal e as outras duas, são desfigurações grosseiras: desobedecem, simplesmente, a qualquer regra do desenho hábil. O céu é vermelho e amarelo, sem sinal do azul comum: quando o azul domina o resto do quadro. Oslo e a Doca de Oslo separam-se perfeitamente do céu pelo contraste do vermelho e amarelo com o azul. Não há uma profundidade clássica distanciando o céu, Oslo e a Doca de Oslo, a montanha e a ponte com as três figuras. A montanha à direita é azul como Oslo e a Doca de Oslo: o que os distingue são a disposição horizontal de Oslo e da Doca de Oslo e a disposição transversal e curva, à direita e ao fundo entre o céu e a Doca de Oslo, da montanha. Mas, no conjunto, o céu, Oslo e a Doca de Oslo, estão pintadas no mesmo plano, sem profundidade, sem um ponto de fuga, que os distinga efetivamente. Mas essa profundidade existe: o que a provoca é o corte, da direita para a esquerda, da ponte: não uma ponte clássica (1893) mas uma ponte com resguardos metálicos vulgares e modernos. Os traços das cantoneiras da ponte funcionam como os traços espessos e negros da planificação do Sintetismo Geométrico.

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Edvard Munch escreveu que O Grito é o grito da Natureza: nós, observadores, vemos que a figura significante grita um grito absurdo e podemos concluir que se trata do grito da alienação humana independente da Natureza: mas somos obrigados a seguir o que disse o autor. O grito de O Grito, que bloqueia os ouvidos para não se ouvir, é o grito da pequenez humana perante a grandeza da Natureza que o envolve: será a reação à transformação ambiental e ao perigo envolvente. A agressão da cara e das cores e a obsessão formal do conjunto transmite alienação, opressão, angústia, medo e finalmente: crítica. A alienação, a opressão, a angústia e o medo são emanações diretas, objetivas, do quadro para quem o olha; a crítica vem da observação analítica, do ver sobre o olhar do observador: O Grito abre-se concetualmente ao olhar e à crítica. Uma crítica contra o homem que transforma matéria inerte em energia, calor e fumo que liberta para a Natureza onde respira e pode sufocar. Uma crítica do Concetual da Estética díspar do Concetual da Arte: se o concetual da Arte é do que se concebe artisticamente, da exclusividade criativa do autor, o Concetual da Estética soma à criatividade artística a abertura criativa, e crítica, do ver do observador. A Estética, do sensível, dirige a Arte, também do sensível, mas por uma sensibilidade dupla, com o observador, ou os observadores, da Obra de Arte, ampliando a sensibilidade do um em direção ao todo. É esse alargamento progressivo que admite o olhar crítico: ou ver duchampiano de duas décadas depois, já em plena Vanguarda II.

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O Grito foi um quadro crítico do homem moderno, industrializado, bélico e poluente, de 1893. A evolução moderna da arte anterior foi crítica da arte conservadora, clássica e académica: crítica que se concentrou, na década de 1890, nas secessões artísticas: a Secessão de Munique em 1892; a Secessão de  Viena em 1897; e a Secessão de Berlim em 1898. As secessões concentraram o papel reivindicativo, do sensível e  ideológico, das transformações artísticas modernas; e o expressionismo de O Grito foi crítico, do sensível e do ideológico: e como que deu azo à intensificação reivindicativa das secessões e à conversão do ponto número 9 no número 10 da Estética..

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Da Vanguarda I para a Vanguarda II, entre 1848 e 1900, ocorreram 38 movimentos. Nesses 38 movimentos 20 foram exclusivos da Pintura: 20/38=53%. 14 incluíram a Pintura e outras áreas: 14/38=37%. A Pintura entrou em 20+14=34 movimentos: 34/38=89%. A transição do ponto 9 para o ponto 10 da Estética foi dominado, quase em absoluto, pela Pintura. Nos 38 movimentos 31 negaram a arte conservadora, académica, elitista, paternalista, clássica e instituída: 31/38=83%. A transição do ponto 9 para o ponto 10 da Estética negou, maioritariamente, a arte académica. Se a transformação estética, da Arte Moderna, ou do ponto 9 para o ponto 10 da Estética, foi da forma a Forma e do belo a Belo pelo domínio plástico da Pintura o gosto foi a Gosto pela ação transformadora dessa disciplina: a Pintura. Como é a transformação do gosto em Gosto que dirige as transformações artísticas, a forma em Forma e o belo em Belo, a crítica pela Pintura, de uma só das quatro disciplinas agregadas por Baumgarten à Obra de Arte, fixou essa disciplina como líder na Vanguarda II e no ponto 10 da linha da Estética.

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A Vanguarda II ocorreu em 1900. Seguiu a ideia do Esteticismo: a Arte pela Arte. Negou a politização da Arte e a objetividade da Vanguarda I e do Realismo. Negou a arte instituída pelas academias e pelas instituições conforme a Vanguarda I, o Modernismo, o Realismo e o Esteticismo: as quatro movimentações gerais orientadoras das transformações artísticas da Arte Moderna no século XIX e da Estética no segmento entre o ponto 9 e o ponto 10. Negou o pré-estabelecido e defendeu o experimentalismo e o anti-tradicional: vindos dos movimentos dominantes. E agregou a si, e à Estética, pelo domínio da Pintura na direção dos movimentos, essa disciplina: abandonando as outras três, e todas as outras, às suas estéticas.

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A distribuição geográfica dos 38 movimentos precedentes da Vanguarda II e do ponto número 10 da Estética foram as seguintes. França 20: 20/38=53%. Inglaterra 6: 6/38=16%. Alemanha 5: 5/38=13%. Dinamarca 1: 1/38=3%. Noruega 1: 1/38=3%. Polónia 1: 1/38=3%. Áustria 1: 1/38=3%. Rússia 1: 1/38=3%. Europa 1: 1/38=3%. Nos 53% de movimentos nascidos em França contam-se quase todos os movimentos fundamentais: o Naif (como base primitiva dos outros movimentos), o Impressionismo, o Sintetismo, o Simbolismo e o Cloisonismo. O Expressionismo, a exceção, foi o único movimento fundamental nascido na Noruega. Se os movimentos fundamentais nascidos em França foram da sensibilidade geométrica e da crítica naturalista o Expressionismo foi também, ou essencialmente, da crítica do homem ao homem: um impulso que se previa mas que nasceu isoladamente, de Edvard Munch. O domínio francês dos movimentos originou a Escola Moderna de Paris em 1900.

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A evolução da Arte Moderna foi a negação da arte académica. A arte académica era a arte transmitida pela técnica desde o tempo clássico: era a arte da Escola, ou Academia, de Belas Artes agregada à Estética por Baumgarten. As escolas, ou academias, de Belas Artes, existem hoje, existiram entre 1848 e 1900 e existiam antes: mas entre 1848 e 1900 a urgência de uma nova Estética e de um novo andamento artístico criou escolas livres, como a Escola de Barbizon e a Escola de Pont-Aven. E a liberdade das  escolas livres fixou-se na Escola Moderna de Paris como centro transversal à evolução artística seguinte. A Escola Moderna de Paris não foi propriamente uma escola e sim um centro geográfico diretor da Arte e orientador das Escolas de Belas Artes. O termo moderna veio por dois motivos: porque a Escola de Paris já existia vinda de Paris como centro mundial das artes desde o tempo bizantino; porque a Arte Moderna, dominada pela França depois da Escola de Paris, só podia originar a Escola Moderna de Paris. E em 1900, em simultâneo com a Escola Moderna de Paris, nasceu o Primitivismo. O Primitivismo, como tendência orientadora plástica da Vanguarda II e da Escola Moderna de Paris, originou o Fauvismo em 1901. A intensidade agressiva da cor e do traço do Fauvismo, na negação da elaboração cromática e do contorno da técnica académica, como que orientou a Arte em direção à Vanguarda III.

ESTÉTICA VIII

 

VIII OS PONTOS 6, 7 e 8 DA LINHA DA ESTÉTICA.

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E seguiram-se outras mulheres pintoras na transição do Maneirismo para o Barroco (1600/1750). Lavínia Fontana (1552/1614): a primeira pintora a ganhar fama internacional e a abrir caminho na Arte a outras mulheres. Sofonisba Anguissola (1532/1620) depois de 1569 e de Catharina van Hemessen foi pintora oficial da corte do rei Filipe II de Espanha. O Barroco retornou ao acrítico clássico da Renascença acrescido da exuberância ornamental acrítica (que cresceu para o Rococó (1720/1750?) do Barroco tardio e do positivismo pleno das mulheres na Arte, como Artemísia Lomi (1593/1653) e Josefa de Óbidos (1630/1684). O ponto número 6 da linha da Estética ocorreu com o Barroco em 1600 pela inclusão definitiva das mulheres na Arte uma vez que o seu estilo acrítico foi díspar da linha da Estética. 

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O ponto número 7 da linha da Estética ocorreu em 1750, na entrada no Neoclássico (1750/1848) quando  Alexander Baumgarten: 1) elevou a Estética Sensível a Estética Disciplinar ; 2) separou a Estética (da Arte), uma só, das estéticas (dos gostos individuais e dos ofícios), uma infinidade; tentou separar a Arte da não-Arte; e quis regular o mercado da Arte. Baumgarten quis racionalizar a Arte no seguimento do racionalismo iluminista vindo de 1637, da publicação do Discurso sobre o Método, de René Descartes. A arte neoclássica foi uma negação do exagero ornamental do Barroco e da sensualidade do Rococó, do hábil, distinto do sensorial da Estética. Essa negação ao acrítico artístico foi uma crítica à Arte exigindo o clássico na carência da inovação plástica. O Neoclássico foi imenso da crítica filosófica, científica e social do iluminismo: como que  não coube nele uma transformação plástica da Arte e retrocedeu ao clássico. Pouco antes de 1750, em 1748 e 1738, arqueólogos descobriram as ruínas de Herculano e Pompeia: o que empolgou ao iluminismo académico, científico e experimental, ao interesse pelo clássico antigo e à negação do Rococó do Barroco. O Barroco, entre 1600 e 1750, foi nulo no andamento da Estética depois das críticas ao religioso de Tintoretto e Caravaggio, Porque o Barroco e o Rococó exageraram na acrítica do hábil na exuberância de pormenores e na delicadeza, e graça, das composições clássicas. A importância do Barroco resumiu-se na entrada das mulheres na Arte. No período Neoclássico ocorreram três transformações fundamentais à evolução social associadas ao pensamento crítico iluminista: a Queda da Bastilha em 1789; a revolução francesa (1789/1799); e a Declaração Universal dos Direitos do Homem (1789). Acontecimentos da evolução intelectual vinda desde Thomas Hobbes (1588/1679), que ofuscaram a evolução da Arte e da Estética fora das ideias de Baumgarten. (7)

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À carência ideológica da Arte, no Barroco e no Neoclássico, opôs-se a riqueza intelectual do iluminismo que aproximou as sociedades arbitrárias às modernas pelo Contrato Social. Thomas Hobbes defendeu que a paz social advém da paz natural imposta pelo Estado. Ao Estado, soberano, caberia impor a ordem social que, sem ele, cairia numa selvajaria oposta à natural. Para Hobbes o Contrato Social resultaria do poder do monarca sobre os súbditos que obedeceriam à lei favorável ao todo. John Locke (1632/1704) defendeu que a sociedade humana é uma sequência da sociedade natural e não pode isolar-se dela: tal como defendeu Hobbes. Mas para Locke a soberania do Estado, dominada por um homem distinto do natural que aspira ao artificial, conduziria ao poder absoluto e à tirania de um sobre os outros em vez da paz do todo. Por isso defendeu a criação do Estado e da Magistratura: e a separação do poder executivo, do Estado, do legislativo, do magistrado. Para Locke o Contrato Social partiria do equilíbrio do poder repartido na soberania dos dois órgãos em direção do equilíbrio social. Para Jean-Jacques Rousseau (1772/1778) o homem nasce livre e em toda a parte vive aprisionado: defendeu, tal como Hobbes e Locke, que a sociedade humana parte da sociedade natural. O Contrato Social de Rousseau é entre dois indivíduos, individuais ou coletivos, não favorecendo nenhum deles em detrimento do outro porque foi assinado por ambos. A ideia do contrato social evoluiu do absolutismo de Hobbes para o liberalismo de Locke e o democrático, das sociedades ditas modernas, de Rousseau. O Contrato Social de Rousseau foi publicado em 1762, seguinte a Estética de Baumgartem e à origem do Romantismo,

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Todos os períodos históricos estão associados a transformações ideológicas, políticas, sociais e artísticas e Estética, de Baumgarten, coincidiu com a origem do Neoclássico: mas nenhum dos artigos que li associou a Estética de Baumgarten à origem do período Neoclássico. Mas as exigências de classificação da Obra de Arte, de tornar a Arte uma área académica e de separar a Estética das estéticas foram do tempo seguinte, do Neoclássico, com uma nova disciplina, a Estética, nas academias de Belas Artes. As regulamentações colocadas pelo filósofo alemão na Arte não regulada anteriormente foram, embora indiretamente, uma crítica cruzada: à arte vigente, o Rococó, e à arte neoclássica, o clássico trazido para o seu período, entre 1750 e 1815 da origem do Romantismo. Também que em 1750 as ideias excediam a crítica ao religioso indo à crítica à desigualdade que levou à Revolução Francesa em 1789. Essa transformação, que do acomodado foi ao ativismo, ocorreu porque o humanismo seguinte a 1350, por mais de 400 anos, seguiu mais desigual e desumano pelos poderes absolutos das entidades católicas e dos príncipes.

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Em 1350, com o Renascimento, nasceu o humanismo: na negação do fatalismo de Aristóteles e da ilusão religiosa; e opondo-se à desigualdade arbitrária da era medieval. O Renascimento foi a origem da esperança para o homem coletivo contra o poder tirânico das entidades Igreja e Monarquia. Foi o renascer da Civilização contra a barbárie vinda da Barbárie que terminara com a origem da Escrita e da Civilização cerca de 7350 anos antes. Mas 1415, com a chegada a Ceuta dos navegadores portugueses e os descobrimentos, deu-se a origem duma escravatura muito mais tirânica que a anterior. A aventura naval de Portugal pelo rei Dom João I visava a expansão territorial e comercial e mais riqueza; mas os líderes católicos, ditadores das leis, viram nas descobertas a oportunidade de ampliação do seu poder económico, social e religioso: em 1452 o papa Nicolau V deu poder a Dom Afonso V de Portugal, e seus sucessores, a conquistar e apoderar-se das terras dos infiéis, pagãos inimigos de Cristo, e a escravizá-los. A igreja católica, e o cristianismo, criou uma barbárie muito mais bárbara que a Barbárie: no tempo do humanismo renascentista que atingiu a saturação no Iluminismo. Em 1231 o papa Gregório IX declarou a pena de morte para os hereges. Ao legalizar a escravatura dos nativos pelos colonizadores o papa ampliou a escravatura imposta pela inquisição desde 1022 nos países católicos. A tortura sofisticada, diabólica, e a morte na fogueira, em ritual público e satânico, foram instrumentos vulgares da igreja cristã medieval e seguinte. A inquisição em Portugal foi instituída em 1536: já no tempo humanista do Renascimento; e terminou em 1821: no período Romântico. A besta religiosa agiu durante quatro longos períodos: o Bizantino, o Renascimento (com o Maneirismo), o Barroco (com o Rococó) e o Neoclássico, o primeiro primitivo e os outros três humanista. Em 1761, no período Neoclássico, o rei Dom Sebastião decretou a libertação de todos os escravos que desembarcassem em Portugal continental; em 1865 Abraham Lincoln decretou a abolição da escravatura nos EUA: uma data do período Neoclássico e outra do período Romântico, a primeira do tempo iluminista e a segunda depois dele. A escravatura vinda dos tempos medievais prosseguiu nos períodos humanista e iluminista. Em 1781 o navio britânico Zong lançou para o mar de Caribe 132 escravos negros: esse acontecimento originou a pintura Navio Negreiro de William Turner, de 1840: 1781 iluminista, crítico da escravatura, e 1840 romântico, dos ideais de liberdade. A desigualdade arbitrária, o poder tirânico e a barbárie sofisticada pela tortura e a guerra, sob a égide das monarquias e da igreja católica, foi transversal a 1821-1350=471 anos humanistas: em 1789, com a Queda da Bastilha, iniciou-se a Revolução Francesa, que terminou em 1799  com o Golpe do 18 do Brumário, dirigido por Napoleão: imperador bárbaro, absolutista, não iluminista: das invasões napoleónicas, da guerra. 1789 foi o fim da monarquia absolutista de Luis XVI e a origem da queda das monarquias na Europa. A Revolução Francesa nasceu do descontentamento das massas e inspirou-se nas ideias iluministas negadas, de forma bárbara, por Napoleão. O Iluminismo foi um período extremamente conturbado em termos ideológicos e em convulsões sociais que não deu espaço à inovação artística. Mas dele, na origem do segmento final, o Neoclássico, surgiu a Estética como disciplina da Arte e a crítica intelectual à desigualdade, à maldade da Natureza Humana e à guerra, que marcaram a Arte do período seguinte, o Romantismo.

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O Romantisto tomou do Iluminismo e do Humanismo a linha libertadora do homem face ao domínio absoluto das monarquias e da igreja católica (combatido por filósofos como Voltaire (1694/1778) e Montesquieu (1689/1755)) senhores dos outros e da guerra, vindos dos tempos medievais. O encanto da pintura A Liberdade Guiando o Povo, de Eugène Delacroix (1798/1863), de 1830, quando da queda da monarquia totalitária de Carlos X, como que representa o idealismo da Arte tomado do idealismo, revolucionário, ou libertador, do Iluminismo. Na Arte surgiram a manifestação explícita contra a guerra por Francisco de Goya e a Natureza, como plano principal na Pintura quando antes era secundário, de John Constable (1776/1837) depois dos céus tempestuosos, naturais e dominantes, de William Turner (1775/1851). A negação da guerra e o elogio da Natureza sobre a Natureza Humana marcaram, em 1815, do Romantismo, o ponto número 8 da linha da Estética: porque o domínio da Natureza sobre a Natureza Humana, ou do natural sobre o artificial, seguiram para a Arte Moderna. (8)

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Os Fusilamentos do 3 de Maio de 1808, de Goya, foi pintado em 1814: no limite final do Neoclássico pré-Romântico (1750/1815) e no fim da era napoleónica. Dos 600000 soldados que invadiram a Rússia em 1812 só cerca de 30000 voltaram a França em 1914, da derrota e exílio de Napoleão na ilha de Elba. Fugindo do exílio e retomando o governo de França o imperador reagrupou outro exército que foi dizimado na Batalha de Waterloo, em 1815, pelas tropas inglesas e prussianas. Os Fuzilamentos do 3 de maio de 1808 retratam a brutalidade da execução de um grupo de espanhóis por um pelotão francês na Espanha ocupada por Napoleão. Antes desse quadro, entre 1808 e  1814, Goya pintou as 82 gravuras Os Desastres da Guerra sobre o sofrimento, a fome e a miséria a que os invasores submeteram os espanhóis. Nas gravuras são comuns montes de cadáveres, crianças e mulheres mortas, corpos mutilados e execuções bárbaras de cidadãos indefesos. Na gravura número 5: uma mulher com um pau e com um filho num braço enfrenta, num motim, os soldados munidos de sabres e espingardas; outra mulher eleva um pedregulho como arma de arremesso contra o inimigo; no chão, coberto de cadáveres, uma mulher moribunda eleva a cabeça e os olhos ao céu. Expulso José I Bonaparte (irmão de Napoleão) do trono espanhol em 1814 sucedeu-lhe Fernando VII que não favoreceu o povo perseguindo os rebeldes aos invasores expulsos e os que tinham ideias iluministas. As 14 Pinturas Negras, murais pintados na Casa del Surdo, retratam figuras famintas, infelizes, tristes e transfiguradas em ambientes obsessivos: aterrorizadas pelo rei espanhol depois do rei invasor. Depois da brutalidade das tropas napoleónicas as Pinturas Negras tratam a brutalidade de Fernando VII contra os iluministas depois de 1804, do fim do Iluminismo pela morte de Emanuel Kant do Ousar Pensar: quando a gravura número 5 é do Ousar Resistir; quando Hobbes, defendendo o governo totalitário, admitira a legitimidade da insurreição contra ele    

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Antes de 1815, entre 1810 e 1814, Goya produziu as 82 gravuras Os Desastres da Guerra. Depois de 1815, entre 1819 e 1823, no tempo romântico, executou os 14 murais chamados Pinturas Negras. Todas essas obras, 1+82+14=97, são contra a guerra e opostas à glorificação dos heróis da pintura clássica. Antes de Sócrates (século IV antes da era cristã) a escola grega, acessível exclusivamente aos rapazes das elites, era do elogio dos heróis da guerra, centrado na Odisseia e na Ilíada, de Homero. Contra isso o filósofo defendeu o ensino livre, para todos, na rua, não épico, e foi condenado e executado por isso: mas as suas ideias ficaram para sempre: e o Renascimento foi o renascer das ideias livres, adormecidas, da Grécia antiga de Sócrates. O Humanismo foi o diluir dos direitos do herói para os direitos dos não-heróis; e o Iluminismo foi a negação do herói e, automaticamente, da guerra (o soberano, do Contrato Social de Hobbes, era dotado do poder absoluto, mas não absolutista, do Estado: para exercer as leis comuns e não para subjugar a comunidade a elas). Na pintura clássica, o rei, na frente da batalha, quase sempre protegido por uma luz divina, era o herói negado por Sócrates 19 séculos antes; na pintura romântica e iluminista, de Goya e de Delacroix, nega-se, a favor do povo, a guerra dos heróis. O ponto 8 da Estética, em 1815, da entrada no Romantismo, marca a crítica ao herói e o elogio da Natureza que se vinha desenhando, a pouco e pouco, havia muito.

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Na literatura renascentista tivemos Luís de Camões (F. 1580) e Miguel de Cervantes (1547/1616): Os Lusíadas, o poema mais belo já escrito, e Dom Quixote de la Mancha: os Lusíadas é da beleza verbal, da epopeia, do culto do herói, e Dom Quixote de la Mancha é da crítica humanista, da negação do épico, do Belo. Na Pintura Diego Velasquez (1599/1660) pintou As Meninas em 1656, já no tempo iluminista, onde o rei e a rainha figuram num plano recuado: porque é um espelho que denuncia a sua presença. É o contrário do quadro épico: o herói não está no primeiro plano, nem no segundo, mas no terceiro: o herói baixou ao humanismo comum. A figura central do quadro é a infanta Margarida: mas o quadro chama-se As Meninas em vez de A Menina. Como ao lado de Margarida estão duas raparigas, suas damas de companhia, As Meninas refere-se às três: numa diluição humanista entre crianças socialmente muito distintas. Velasquez, ousadamente, está representado no segundo plano, superior ao do rei. Mas antes de Velasquez, em 1434 e em pleno Renascimento humanista (?), Jan Van Eick (1396/1441) pintou o Casal Arnolfini incluindo-se na composição, no pequeno espelho ao fundo. Arnolfini era um Médicis, da alta nobreza romana, e a Infanta margarida era filha do rei: a ousadia da elevação do artista, enquanto a descida do príncipe, cresceu de Van Eick para Velasquez e do Humanismo para o Iluminismo na aproximação ao Romantismo e ao Moderno.

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Os Desastres da Guerra e as Pinturas Negras de Francisco de Goya desobedecem à perfeição e nitidez clássicas: sugerem a continuação da abstração figurativa iniciada com Tintoretto no tempo maneirista e que eleva a subjetividade, da expressão e do sensível, à objetividade, do visual e do hábil, da Arte Moderna nascida em 1848. Ao ilustrar o fusilamento Francisco de Goya negou o fusilamento: foi o oposto do clássico decorativo e do elogio épico, que abrilhantava o objeto, ou figura, representados: foi uma crítica indireta, ou neocrítica primária, à guerra e à bestialidade humana. Se no clássico a forma e a beleza (objeto, ou figura, imitados) iam a Forma e a belo diretamente pelo gosto artístico simplificado, na neocrítica primária a forma foi a Forma e o belo foi a Belo pela alteração do gosto em Gosto: o gosto do gosto pela Arte; e o Gosto do gosto da Estética, da crítica contraditória, pelo contrário. Velasquez foi pintor da corte de Filipe IV de Espanha mas não era considerado artista; Sofonisba Anguissola (1532/1625), dama de companhia da rainha Isabel, foi pintora da corte espanhola mas não era considerada artista: porque em Espanha considerava-se que a pintura vinha da destreza manual, do hábil, enquanto as artes, como a música, o teatro e o canto, vinham da sensibilidade mental. A Pintura era considerada um ofício e não uma arte. Uma avaliação primária da Arte, depois alterada: mas conforme à análise da Arte Moderna em que o hábil, do decorativo, do perfeito e do ornamental, não é Arte: daí que a Estética exigiu a crítica, e a neocrítica primária que evoluiu na arte Moderna para a neocrítica, na fuga ao hábil em direção ao sensível. A arte do hábil, ou do manual, era e é arte, com a sua estética, mas não era e não é Arte, da Estética: porque a Arte é efetivamente mental, sensorial e crítica. Sofonisba Anguissola, italiana, foi do período Maneirista e Barroco; em Espanha era considerada artesã, de ofício: não tinha autoridade para assinar as suas obras. Muitos dos seus quadros foram atribuídos a pintores como Van Dick, Il Bronzino, Francisco de Zurbarán, El Greco e Leonardo da Vinci: o que mostra que os grandes artistas clássicos não se diferenciavam tanto pelo Belo mas mais pelo estatuto mediático que atingiam. Dois exemplos disso são Johannes Vermmeer (1632/1675) e Vincent Van Gogh (1853/1890) que nasceram pobres, viveram pobres e os seus quadros valorizaram-se exponencialmente depois a favor dos outros, os mercadores da Arte. A ousadia e a mancha negra críticas de Velasquez e de Goya foram aproximações ao moderno da Arte. A neocrítica primária de Goya foi uma antecipação à neocrítica expressionista de O Grito, em 1893, de Edvard Munch. A crítica ao eleito e ao mediático a desfavor da Arte foi, implicitamente na separação do que é Arte do que não é Arte,  da Estética de Baumgarten, de 1750,  e é da minha Estética, de 2025: porque hoje permanece, a favor das elites, a falsificação na avaliação da Arte e na mediatização do Artista.

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Em 1868 Edouard Manet pintou A Execução de Maximilliano. Em 1937 Pablo Picasso pintou Guernica, em1944/45 A Casa Cemitério; e em 1951 Massacre na Coreia. Massacre na Coreia é uma negação extraordinária dos crimes de guerra e da guerra: as vítimas, mulheres e crianças, estão nuas; as crianças estão desesperadamente agarradas às mães; as caras cúbicas das mulheres, símbolos da simplicidade e do afeto opostos à violência, refletem um sofrimento atroz na frente do pelotão de fuzilamento: numa crítica indireta, A Execução de Maximiliano, de Manet, e Massacre na Coreia, de Picasso, completam uma linha vinda de Os Fuzilamentos do 3 de Maio de 1808 de Goya: seguem o mesmo padrão descritivo e crítico. E negam a guerra: a essência artística, fixada sensitivamente pelo Dadaísmo, de 1916. Ao negar a guerra, sendo a guerra uma alteração humana, defenderam o natural contra o artificial. Velasquez ao minimizar o rei e a infanta, não a baixando ao patamar das duas meninas de companhia mas pondo as três no patamar livre, de Rousseau, em que nasceram, nega indiretamente o artificial da corte, e da distinção humana, a favor do naturalismo iluminista. A denúncia da escravatura do Navio Negreiro, de Turner, foi uma negação indireta da desigualdade arbitrária, artificial, a favor da igualdade humanista, próxima da lei natural. Os céus de Turner foram elogios à grandeza da Natureza sobre a fragilidade humana: e anteciparam, na crítica anterior à neocrítica, o céu de O Grito, de Munch. Os bosques de John Constable trazem a Natureza para o primeiro plano quando antes se ficavam pelo plano de fundo: e também aí, sem vestígio humano, a Pintura critica indiretamente o homem artificial. A crítica indireta (ou neocrítica primária, entre a crítica e a neocrítica) crescente de Velasquez para Turner, Delacroix, Goya e Constable, centrada no elogio do natural contra o artificial, determinou o ponto 9 da Estética quando, em 1848, os pintores de Barbizon sairam para o Bosque de Fontainebleau pintando-o diretamente. O ponto 9 da estética deu-se porque a neocrítica primária, como crítica específica da Arte, e a crítica ao artificial, dispersos anteriormente convergiram, ou unificaram-se, em 1848 num movimento, o primeiro da Arte Moderna: a Escola de Barbizon. (P9)

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Verbalmente, ou pela escrita, o homem manifesta diretamente o Não à guerra! e o Não ao artificial! Ambos os gritos podem ampliar-se pelas palavras nos discursos e na literatura. Mas na Arte o expressionismo não é direto, não é descritivo, como na oralidade e na escrita: ele é sintético. Pela sintetização da Arte contra a ampliação descritiva das outras artes houve que negar a violência pela amostragem exacerbada da violência: foi isso que fez pela primeira vez Francisco de Goya. Os Fuzilamentos do 3 de Maio foram a primeira manifestação crítica contra a guerra; A Execução de Maximiliano, de Manet, foi a segunda manifestação crítica contra a guerra; O Grito, de Edvard Munch, foi a terceira manifestação crítica, pela neocrítica declarada na máscara, anti-natural, ou artificial, contra a alienação humana. E o Não à guerra! e o Não ao artificial! firmaram-se decididamente na Arte pelo Expressionismo Alemão seguinte a 1920. A raiz do Expressionismo Abstrato, depois do abstracionismo romântico do homem com a Natureza, de Turner e de Constable, veio do Romantismo e do quadro diabólico de Francisco de Goya, de  1808. O fuzilamento de inocentes é simplesmente diabólico: a observação artística tem de olhar Os Fuzilamentos do 3 de maio,  A Execução de Maximiliano e o Massacre na Coreia com o ver acima do olhar, da neocrítica sobre a crítica primária e a crítica, da observação dadaísta de Marcel Duchamp, de 1917: pelo que o impulso duchampiano, da Estética sobre a Arte, também tem a sua raiz no romantismo de Goya.

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Na maioria das transições o salto foi positivo no andamento social e artístico. Mas nem sempre foi assim: no caso do Neoclassicismo o sentido foi regressivo: contudo o que delineou a linha da Estética  foi o sucesso evolutivo do conjunto. Um sucesso equivalente ao que vai acontecer no andamento da Arte Moderna por cerca de 187 transformações artísticas, umas regressivas, outras neutras e outras progressivas, até ao presente.    

ESTÉTICA VI VII

 

VI  OS PONTOS 1, 2 e 3 DA LINHA DA ESTÉTICA.

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Em Sócrates, com o escalar do belo sobre a beleza da alegoria da imitação, ocorreu o ponto número 1 da Estética. Por Platão, há mais de 2350 anos, com o duplo afastamento na imitação e o inatingível do Belo ocorreu o ponto número 2. Ao fixar-se o segundo ponto criou-se a linha da Estética. Por Aristóteles, há mais de 2320 anos, com a inclusão da crítica na imitação artística e a queda do Belo do inalcançável para o terreno, ocorreu o ponto número 3 da linha da Estética. Ao separar o teatro crítico do acrítico Aristóteles não negou a arte à comédia: afirmou sim que na estética do Teatro a tragédia tinha o impulso da Arte que a comédia não tinha: a crítica. O que fez foi distinguir a Arte, crítica, da arte, acrítica, aquela dirigida pelo impulso ideológico fundamental e esta do entretimento, do decorativo, dp hábil e do útil. Foram 3 demarcações ideológicas, dadas pelo pensamento de três filósofos, na origem do andamento estético, da separação da Estética das estéticas e da Arte das artes, ou ofícios. Os pontos seguintes, até à Arte Moderna em 1845, não nasceram de impulsos individuais e sim de transformações históricas: mas em todos eles esteve presente a crítica. A crítica foi o elemento da continuidade linear da Estética que só sofreu uma descontinuidade com o Barroco.

 

VII OS PONTOS 4, 5 e 6 DA LINHA DA ESTÉTICA.

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A crítica imposta por Aristóteles na Arte esteve ausente durante cerca de 16 séculos e só emergiu com o humanismo renascentista: do Decameron (escrito entre 1348 e 1353) de Giovanni Boccaccio (1313/1375), que ridicularizou o eclesiástico na negação da beatitude bizantina; da pintura de Giotto (1267/1337); e da invenção da imprensa (1430/1440) por Johan Gutemberg(1394/1650): depois da Comédia de Dante Alighieri (1265/1321) ser rebatizada, por Bocccaccio, de Divina Comédia. Com o Renascimento, há cerca de 674 anos (1350/1615)), ocorreu o ponto número 4 da linha da Estética. A crítica artística associou-se à critica literária num andamento não orientado individualmente como os anteriores e sim por variantes sociais e históricas. A crítica artística da origem renascentista apagou-se no seu momento ofuscada pela evolução técnica da Arte e só ressurgiu com Tintoretto e Caravaggio no Maneirismo, ou Renascimento tardio, cerca de 1515.

 

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Com o Maneirismo (1515/1599) ocorreu o ponto número 5 da linha da Estética. Nele convergiram diversas variantes na reivindicação de novas formas de representação artística negando o classicismo renascentista: no uso de cores não naturais; na distorção simétrica das figuras e no seu alongamento; na crítica dupla, ao religioso e ao homem aristocrático; (1) na entrada das mulheres na Arte ; (2) e na crítica ao religioso com a plasticidade manchada em escuro e claro de Tinttoreto. (1) Plantilla Nelli (1524/1588), freira em Florença, criou uma escola de pintura para freiras no convento. Catharina  Hemesen (1528/1578) foi a primeira mulher a executar auto-retratos e a trabalhar como pintora oficial para uma corte (de Espanha depois de 1554). (2) Numa última ceia de Tintoretto (1518/1599) Jesus não é a figura central na mesa; a figura central do quadro é um cão que ladra para o ajuntamento bíblico: com as imagens descoloridas em mancha muito distante da nitidez clássica renascentista anterior. Ladrando para a cena o cão nega-lhe o sagrado e eleva a sua irracionalidade(?) animal sobre a racionalidade (?) humana no metafísico. A crítica geral maneirista e a crítica religiosa de Tinttoreto e Caravaggio sucederam a crítica religiosa de Giotto estagnada durante os 1615-1350= 265 anos da evolução técnica renascentista. 

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Atribui-se o Renascimento ao período entre +/- 1350 e 1599 e o Maneirismo entre +/- 1515 e 1599: inclui-se o Maneirismo no Renascimento Tardio. O Renascimento, pelas críticas de Giotto, de Bocacio e de Dante e a negação da lei fatalista de Aristóteles, floresceu das trevas medievais: mas só no nascimento. As traduções bíblicas fiéis de Leonardo da Vinci, de Miguel Ângelo e de Rafael, que representam a arte renascentista, não têm o impulso giottiano: pelo contrário o seu classicismo é técnico, sumariamente religioso e não crítico. Poderá dizer-se que o classicismo, multiplamente negado na movimentação da Arte Moderna de mais de 500 anos depois, é não humanista vindo da origem do humanismo. E as artes de O Príncipe, e de  A Revolta dos Ciompi, de Nicolau Maquiavel (1469/1527), mostram que a política renascentista é da desigualdade pelo emprego arbitrário da força desumana do forte contra o fraco: o oposto do humanismo de que emergiu. E o Maneirismo, de 1515 a 1599, evoluiu com a crítica social, com a mancha abstrata e a crítica bíblica de Tintoretto, com a agressividade anti-religiosa de Caravaggio e o grande passo humanista, a inclusão das mulheres na Arte: um novo segmento da Estética distinto do Renascimento. No Maneirismo ocorreu o ponto número 5 da linha da Estética.

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No Maneirismo final houve a crítica de Caravaggio. Caravaggio (1571/1610). colocou nas figuras de Santa Catarina de Alexandria no quadro com esse nome (1598/99), de Judite em Judite Decapitando Holofernes (1599) e de Maria Madalena em Marta e Maria Madalena (1598), figuras bíblicas incontornáveis do idealismo católico e cristão, o retrato de Filide Meladroni, meretriz, ou prostituta. O seu expressionismo crítico foi explícito nesses três quadros porque o Retrato de uma Cortesã, com o mesmo rosto, de Filide Meladroni, iniciou-se antes deles (1597/1599). A sua pintura dramatiza-se no contraste do claro e escuro não clássico, não renascentista e não maneirista, do Barroco. No quadro Marta e Maria Madalena, de 1598, o pente de Maria Madalena tem um dente partido. Porque razão pintou Caravaggio o pente da cortesã da elite romana sem um dente? Sendo o marfim de dente de elefante ou de morsa o pormenor foi, muito provavelmente, a crítica à crueldade, desumana, do homem para os animais. Se assim foi a crítica ao desequilíbrio ambiental, do tempo atual e da Arte Moderna que contém a crítica à agressividade para com os animais (explicitada em Francis Bacon (1909/1992)), nasceu na transição do Maneirismo para o Barroco, há cerca de 425 anos, com Caravaggio. 

ESTÉTICA II III IV V

 

 II ESTÉTICA DISCIPLINAR E ESTÉTICA. A BELEZA E O BELO. O ARTIFICIAL SOBRE O NATURAL. O CAOS.

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Se a beleza é das coisas naturais o Belo, a sublimação da beleza, é da Arte: na hierarquia do estado natural, dos objetos da natureza, para o estado artificial, dos objetos criados pelo homem. A criatividade vem, fundamentalmente, do impulso do natural para o artificial da evolução humana desde tempos imemoriais partindo do hábil. Se a Estética é da Arte contornando o Gosto, a Forma e o Belo ela não vem de Alexander Baumgarten, do século XVIII, vem de Sócrates, da Grécia antiga e do século IV antes de Cristo, da Alegoria da Imitação que implicou a ideia de (B)belo acima da de beleza. Zeuxis convidou Parrasius para ir ao seu atelier ver o seu último quadro. Parrasius foi e ficou maravilhado olhando a natureza morta que era a imitação perfeita dum cacho de uvas. A pintura, uma forma artística e artificial, da Natureza Humana, superava a beleza do cacho de uvas, uma forma da Natureza, indo a belo. A beleza, do cacho de uvas, da Natureza, foi a belo, da imitação, ou do artificial: houve a separação de beleza e belo porque o artificial não podendo superar linearmente a beleza da Natureza superou-a paralelamente, na sua beleza particular pela criatividade, o belo. O belo era tão perfeito que um bando de pássaros entrou pela janela e foi bicar a tela. O elogio da imitação elevava a beleza, dos objetos naturais, a belo, dos objetos artísticos, artificiais. Parrasius, impressionado, convidou Zeuxis para ir ver também o seu último quadro. Foram. No atelier do colega Zeuxis não viu nada de novo e questionou-o. Parrasius disse-lhe que a pintura estava por detrás do cortinado da parede. Zeuxis foi e quis agarrar o cortinado: mas não conseguiu porque ele era a pintura de Parrasius. Se Zeuxis enganou os pássaros e Parrasius enganou Zeuzis Parrasius era melhor pintor que Zeuxis: porque a perceção cognitiva do homem é superior à perceção intuitiva dos animais: e a imitação de Parrasius era mais perfeita, mais criativa ou mais bela, que a de Zeuxis. Houve, consequentemente, partindo da beleza espontânea, uma ascenção do belo em mais belo em direção ao Belo da Obra de Arte. Associados ao Belo estariam o Gosto e a Forma da Estética Embrionária que cerca de 2100 anos depois, em 1750, por Alexander Baumgarten evoluiu em disciplina.

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Depois de Sócrates Platão, pelo duplo afastamento do inteligível para o sensível, da imitação, entre o objeto imitado e a imitação, concluiu que o Belo era utópico, pondo a Obra de Arte como algo a almejar sistematicamente, no  inatingível, no limite em tudo semelhante ao limite matemático. O filósofo considerava que as coisas, incluindo os homens, a copiar, já eram cópias sensíveis de modelos originais inteligíveis: uma relação absurda que admitia dois mundos iguais e paralelos num só mundo. Vindo de trás, da alegoria da imitação, só há dois belos: o do objeto real, a beleza, e o da imitação, o belo. E é assim porque na transição do belo em mais belo da imitação só há dois patamares: no primeiro a perfeição do belo engana a sensibilidade irracional, dos animais; e no segundo a perfeição do belo engana a sensibilidade humana: e essa exclusividade diz-nos que o belo vai efetivamente a mais belo, ou a Belo, na imitação, e que a Obra de Arte não é utópica, é atingível e tangível simultaneamente. Intersetando os dois critérios, do inatingível e do atingível, prevalece o segundo porque a forma, ou Forma, são tocáveis: quando o primeiro parte duma relação utópica (de um meio inteligível, do criador do objeto imitado, para outro meio inteligível, do artista que copia) não tangível. A Obra de Arte, e o Belo, na Imitação, logo no princípio, eram atingíveis: da Arte pela criação artística.

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A impossibilidade platónica de atingir a Obra de Arte devido ao duplo afastamento entre a imitação e o objeto imitado sugeria que o Belo era do objeto imitado e não da imitação: sugeria que o Belo era da Natureza (ou de uma natureza metafísica) e não da Natureza Humana, ou Arte. Mas essa sugestão é incorreta: porque as ideias de Belo e de Obra de Arte nasceram quando nasceu a ideia de Arte e de Estética, na Alegoria da Imitação de Sócrates: são do homem e de nenhuma utopia. Isso porque desde há cerca de 2400 anos, da Imitação ao expressionismo moderno, subsiste a teimosia, na Arte e na Literatura, da Obra de Arte inatingível. Uma teimosia metafórica. Na ideia da aspiração superior, ou suprema, do artista, ou da Arte, superarem indefinidamente a imitação em direção ao imitado, dois objetos terrenos (muito embora o objeto imitado possa ser uma figura ideológica), disjuntos entre si e autónomos. 

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É inquestionável a beleza da Natureza, das montanhas, dos voos dos pássaros, dos bosques selvagens, e das águas dos rios e das nascentes. Por isso na sequência Beleza, belo e Belo, a Beleza é da Natureza, o belo é das estéticas e o Belo é da Estética, por dois motivos: porque tem de haver distinção de associação; e porque facilita o estudo da evolução da Estética e da Arte, o objetivo deste livro. Daí que a beleza é do natural e o belo e o Belo são do artificial. Se a sequência for crescente o belo, do ornamento e artificial, será mais belo que a beleza natural; contudo a beleza natural transcende, extraordinariamente, o belo ornamental: e aí surge a primeira contradição da relação da Natureza com a Natureza Humana, do homem, na  Arte. A beleza é mais bela que o belo mas o belo, artisticamente, tem mais beleza que a beleza. Por essa contradição o homem, na sua evolução ornamental vinda do homo-habilis de há mais de 10^6 anos, transcendeu a beleza natural artificialmente, pela fabricação. Tudo bem se o belo e a beleza, a primeira artificial e a segunda natural, convivessem harmoniosamente: mas não convivem. O domínio do belo sobre a beleza trouxe ao caos ambiental: e é por aí que o Belo, da Estética e da Arte, denuncia como contraditória a contradição referida. A contradição, da ascenção do belo sobre a beleza, assume-se como contraditória no expressionismo artístico: onde, pelo contraditório, a Arte Moderna seguinte a O Grito de Edvard Munch, busca a Obra de Arte como veículo, da Arte e da Estética, a favor da beleza (ambiental) que o belo contrariou.

 

III A CONTINUIDADE LINEAR DA ESTÉTICA. CRÍTICA E NEOCRÍTICA. O ESTADO CRÍTICO.

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Logo no início da Estética foi o seu Gosto quem determinou a sua Forma e o seu Belo e continuou assim em todos os momentos da sua evolução passando pela Arte Clássica até à Arte Moderna e a atualidade. As definições do Gosto, da Forma e do Belo de cada período histórico foram marcadas pelas transformações fundamentais que fizeram as transições: daí que a Estética seguiu uma linha feita da ligação desses pontos transitivos que durou mais de 2400 anos. O primeiro ponto da linha foi o da  Imitação de Sócrates. O segundo ponto foi com o Belo de Platão fixando-o como aspiração impossível da Imitação e da Arte. O terceiro ponto foi com a crítica de Aristóteles. O terceiro filósofo grego viu Arte na tragédia e viu arte na comédia teatrais: porque a comédia era neutra e a tragédia era crítica: e a crítica fixou-se no terceiro ponto da Estética porque toda a linha seguinte, até ao presente, foi de aspiração crítica. O quarto ponto, o Renascimento, nasceu da crítica ao religioso e à lei do fatalismo de Aristóteles. No quinto ponto, na transição do Renascimento para o Maneirismo, esteve a crítica à distinção aristocrática e, por Tinttoreto, da abstração inicial, ao metafísico. E assim por diante até atingirmos a Arte Moderna em 1848 e nos centrarmos nos cerca de 180 movimentos artísticos até ao presente. Estética, este livro, interpreta essa linha crítica que, com a Estética como disciplina da Arte desde Alexander Baumgarten (1750), atingiu a crítica moderna, ou neocrítica, no Expressionismo seguinte a O Grito, de 1893, de Edvard Munch.

 

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A critica de Giotto, de Tintoretto e de Caravagio ao religioso era direta: no olhar terreno, na indistinção entre Jesus e os apóstolos e nos retratos de figuras santas no rosto duma meretriz. A crítica de Eugène Delacroix à sociedade humana foi direta na figura duma mulher seminua representando a liberdade libertando o povo. A crítica á lei do fatalismo de Aristóteles, negada no Renascimento mas persistente até ao Romantismo, foi direta no Navio Negreiro de William Turner. A crítica à bestialidade da guerra, já na aproximação ao moderno, de Francisco de Goya, em Os Fuzilamentosde do 3 de Maio, foi direta. A crítica ao artificial, pela elevação da Natureza ao primeiro plano das composições da Escola de Barbizon, de 1849 e da origem da Arte Moderna, foi direta. A representação crítica do emocional contra o fotográfico do Impressionismo foi direta. Mas, em 1983, com O Grito, Edvard Munch criticou o artificial, da decadência humana, pelo artificial e o decadente; criticou a alienação humana com um quadro alienado: numa crítica indireta, ou neocrítica. A neocrítica foi o impulso essencial da transformação, na Arte e na Estética modernas, do gosto em Gosto e da forma e do belo em Forma e em Belo. A neocrítica de Munch foi depois de Pablo Picasso, da crítica à agressividade humana pelas images agressivas e da guerra, como em Mulher Chorando e Guernica, e só se afirmou duplamente, na Arte e na Estética, por um movimento: o Expressionismo Alemão seguinte a 1920. A análise da evolução da Arte e da Estética segue o avanço da neocrítica do feio contra o feio, do bruto contra o bruto e do grotesco contra o grotesco, do avanço da Arte no contraditório seguinte a 1893. A Arte Moderna usa o contraditório e a neocrítica, das disparidades entre belo e beleza e da crítica indireta exclusiva da Arte. A neocrítica é anterior à arte bruta (não de Dubufet), é da arte quase bruta, aquela ingénua e esta crítica pelo bruto ao bruto.

 

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A imitação, vinda de há mais de 2400 anos, substituía a imagem real, concreta, histórica, ou mitológica, pela sua cópia: não admitia espaço para a crítica. A presença da crítica em Giotto, Tintoretto e Delacroix foram desvios (aqueles espaços) à cópia da imitação. Em Goya, no Fuzilamentos do 3 de Maio, e em Turner, no Barco Negreiro, a crítica do real é feita com a imitação do real: a cópia do evento crítico, a guerra e a escravatura. A crítica pelo desvio foi à crítica direta do confronto objetivo na imitação e à neocrítica pelo subjetivo, dos adjetivos, do feio pelo feio, do bruto pelo bruto, do violento pelo violento, já no abstrato, posterior à imitação. A imitação era decorativa e não era ideia. Se o decorativo era acrítico e a Arte é ideia a Arte tinha de ultrapassar a imitação, ir ao abstrato, para se tornar crítica. O desvio da imitação e o confronto da realidade crítica pela sua imagem foram alterações intermédias ao avanço do decorativo para o crítico e a neocrítica, Pelo decorativo, partindo da forma real ou imaginada, e a imitação acrítica, a forma ia a forma e o belo ia a belo pela inércia do gosto; pela abstração crítica, a forma vai a Forma pela dinâmica da neocrítica que eleva o gosto a Gosto e o belo a Belo. Foram a crítica e a neocrítica, como impulsos ideológicos, que deixaram a imitação e o decorativo nas suas estéticas e elevaram o abstrato à Estética da Arte no andamento do antigo para o novo.

 

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Se a crítica foi direta no tempo da imitação plástica e da fotografia ela tendeu a neocrítica, uma crítica indireta, da alteração plástica centrada no rosto. O Grito de Munch é emitido por uma cara alterada plasticamente. Os rostos de Picasso são caras alteradas plasticamente pelo cubismo. O Expressionismo Alemão, da crítica declarada do grotesco pelo grotesco, centra-se na transfiguração do rosto em máscara.  Fantasma com Máscara (1952), de Karel Apell, do movimento CoBrA, desdobra a figura humana na dupla máscara, a do fantasma e a da máscara do fantasma, enfatizando a máscara na plasticidade da Arte Moderna. Mas, antes da transformação facial, que leva do rosto, do homem natural, à máscara, do homem artificial, Paul Cézanne alterou plasticamente a paisagem pelo cubismo inicial. E já antes do Cubismo e do Impressionismo os pintores de Barbizon pintando diretamente (sem esboço), desrespeitando as regras clássicas e académicas, o Bosque de Fontainbleau, alteraram plasticamente a paisagem artística. Essa alteração plástica da paisagem, transportando a fuga ao real, evidenciou-se am 1904 com o fauvismo, primitivo, colorido e intenso. A neocrítica será a crítica da Arte Moderna pela alteração agressiva do rosto, da paisagem e do objeto, ou da forma: a forma vai a Forma pelo desvio crítico (do homem ao homem) do gosto em Gosto: e o belo vai a Belo pela transformação plástica distinta da cópia da imitação e da fotografia. O evento fotográfico trouxe a negação da imitação e a elevação da plasticidade nas Artes Plásticas: ao mesmo tempo que abriu a Arte à conversão da crítica na neocrítica.

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Munch colocou a alienação humana, da queda do belo, do artificial, perante a beleza, do natrural, na Arte. Em 1916 Tristan Tzara, Hugo Ball e Hans Arp, com o Dadaísmo, colocaram na Arte a oposição à guerra. Em 1945, depois das bombas atómicas sobre Hiroshima e Nagasaki e da II guerra mundial, o Expressionismo Concetual criticou o caos ambiental pelo caos do salpicado de Jackson Pollock: depois do alerta do Aquecimento Global de 1938, por Guy Callender. Em 1945 ao alerta científico associou-se a crítica artística na negação do Estado Crítico nascido com o nuclear e que cresceu até hoje. O científico associado ao artístico como que legitimou a neocrítica da Estética. A Arte Moderna seguinte a 1945 criticou o artificial, a guerra e o Estado Crítico. Pelos métodos críticos convencionais, a oralidade e a escrita, a crítica é feita diretamente pelo sinal linguístico, a palavra. Não ao artificial! Não à guerra! Não à poluição ambiental! Três gritos que a crítica direta, como do livro, da televisão e da internet devia usar mas não usa. Três gritos usados pela neocrítica da Arte e da Estética. Esses três gritos seguintes a 1945  tiveram eco em 1963 no vídeo Sun In Your Head, de Wolf Vostel, que demarcou uma nova Vanguarda da Arte e um novo ponto da Estética a seguir até à Arte Crítica, ou Arte Quase Bruta, de 1919. Quando a palavra só é utilizada no contraditório, no sentido crítico indireto, em algumas correntes artísticas porque a Arte comunica pelos signos e não pelos sinais. Quando o sinal, como o linguístico, vai a signo, do convencional para o artístico, a crítica vai do direto ao indireto: a neocrítica.


IV VANGUARDA. UNIÃO LINEAR DA VANGUARDA À ESTÉTICA. A VANGUARDA E A NEOCRÍTICA. EXPRESSIONISMO NEOCRÍTICO.

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A análise da evolução da Arte segue a crítica e a neocrítica dos seus percursos inicial e final. Quando a neocrítica se segue à crítica na linha da Etética em continuidade linear. Em 1848, com a ideia do que vai à frentre na Arte, a Vanguarda seguiu o alinhamento racionalista, ou linear, da Estética: e não podia ser de outro modo porque Arte, Vanguarda e Estética, são comuns e não disjuntas. Estética, crítica, neocrítica e Vanguarda unem-se na linha contínua vinda da origem da Arte. Ao fundir-se, na sua origem, na linha da Estética, a Vanguarda adquiriu o seu estatuto de Entidade: quer dizer que é a Estética, a disciplina da Arte, que determina o que é a Vanguarda (e a Obra de Arte) de cada período artístico e não os indivíduos, como críticos de arte, curadores e académicos, alinhados em interesses alheios ao andamento estético da Arte. O que define uma Vanguarda, ou um ponto da Estética, não são os movimentos, nem os líderes artísticos (?) e sim a ideia subjacente a esses movimentos e lida no que os conduz, na sua disciplina, a Estética: só porque Arte é, sobretudo, ideia. ideia crítica: porque a ideia sem crítica não é propriamente ideia. A Vanguarda, na linha da Estética, distinguiu a arte Moderna da arte que a precedeu.

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A imagem alienada, e andrógina, de O Grito de Edvard Munch, foi a primeira figura centrada no feio, no grotesco e na bestialidade figurativa da Arte para a figura humana, ou homem. O feio, o agressivo e o bruto foram depois das figuras e composições cubistas de Pablo Picasso. E esses adjetivos fixaram-se definitivcamente na Arte Moderna no Expressionismo Alemão. Antes da agressividade expressionista a Arte era criticamente benevolente, adaptada ao belo otimista da psicologia e crença antigas, ancestrais. O otimismo, onde a crença no artificial, das religiões e das tecnologias, admitia sempre o bem futuro sobre o mal presente, anulava, magicamente, o pessimismo. Podemos admitir que o pessimismo antes da neocrítica não existia: porque a força psicológica, biológica e transcendente, do otimismo, anulava o seu oposto, o pessimismo, indo do artificial para mais artificial. Mas aconteceu que esse andamento otimista  conduziu à saturação ambiental. Deus, o ser otimista extremo do individual, deixou ir ao caos o geral, o homem, conduzindo-o ao Estado Crítico e ao caos: donde a crítica expressionista, ou neocrítica, pelo feio, o grotesco, o macabro, mesmo o diabólico, da figura otimista e suicidária humana. A agressividade da neocrítica, que o grande universo de otimistas ingénuos, com os manhosos e irresponsáveis, chamam pessimismo não é pessimismo: é a crítica, pelo expressionismo contraditório, ao péssimo da besta humana que tende a ir do caos para o caos.

 

 ABSTRAÇÃO CRÍTICA. CLASSIFICAÇÃO ARTÍSTICA. DEFESA  AMBIENTAL.

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No princípio da Arte, em Sócrates, a criatividade era imitação: por isso hoje, quase 2500 anos decorridos e porque não estagnámos no princípio, a Arte não é imitação. Se o contrário da imitação é a abstração a Arte hoje é da abstração; mas o homem evoluiu na ideia e é sumariamente ideia: logo que a abstração da Arte é ideia e não a ausência dela. E as duas variantes da evolução da Arte Moderna, a geométrica que convergiu no Suprematismo, e a crítica que convergiu no Expressionismo Alemão, fundiram-se no Expressionismo Abstrato, necessariamente crítico: porque da interseção do acrítrico com  o crítico resultou o crítico, da ideia e da génese humana. A imitação, na sua origem, incidia sobre o objeto real: pelo que a abstração, o oposto do real, será o simétrico da imitação. Logo no princípio a Obra de Arte e o Belo eram da imitação e não do objeto imitado: e a Obra de Arte e o Belo só seriam inatíngíveis se fossem do objeto imitado, duplamente afastado da imitação, e não da imitação. Logo que a Obra de Arte, hoje como no princípio, são acessíveis e reais: no princípio no hábil, da cópia; e no fim no ideológico, da crítica.

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Alexander Baumgarten, no século XVIII, criou a Estética da Arte para que se pudesse distinguir a Arte da não-Arte. Por ele a Arte seria das disciplinas académicas. Mas a evolução da arte Moderna negou a arte académica indo contra a opinião do filósofo. Vinda de Sócrates a Estética atingiu a Estética Moderna simultaneamente à origem das vanguardas com a Escola de Barbizon. Este livro estuda o andamento da Estética até á origem da primeira Vanguarda para prosseguir no seu estudo comum. Sendo a Vanguarda de cada período artístico que determina o Gosto da Estética a distinção da Arte da não-Arte vem da classificação da Obra de Arte partindo do Gosto.  O Gosto Transfere a classificação da Obra de Arte dos indivíduos, e dos seus gostos, para a Estética: os críticos de Arte seguem o gosto disciplinar, ou Gosto, alheios aos seus gostos, ou às suas estéticas. Trata-se de um método racional equivalente aos métodos racionais das outras disciplinas escolares: da cultura comum. Finalmente, com a negação do artificial em 1848, com a negação dadaísta da guerra e a convergência das duas negações em 1945, depois do alerta do aquecimento global de 1938, a Estética e a Arte abraçaram a luta contra o Estado Critico da problemática global. E a Arte Crítica, de 2019 (de minha autoria e que termina este livro), depois do grito de emergência de Sun In Your Head, de 1963, dita a crítica ao caos na exigência da classificação artística.

ESTÉTICA I

 I

INTRODUÇÃO

 

1

A Estética é a disciplina da Arte. A disciplina da Arte, como a disciplina de qualquer outra área ecolar, segue um padrão racional e não se dispersa irracionalmente. Mas, regra geral, dizem que a Estética tem a ver com o gosto de cada um. Se a Estética variasse pelo gosto de cada um haveria uma infinidade de estéticas, uma dispersão irracional do seu significado e uma anulação da sua natureza disciplinar. Contudo a Estética é uma disciplina e cada indivíduo tem a sua estética distinta das estéticas dos outros: o que nos leva a concluir que há a Estética, disciplina da Arte, e a estética, do gosto de cada indivíduo. E para responder ao gosto de cada indivíduo cada ofício, como a do calçado, do vestuário e do mobiliário têm a sua estética adaptada. Pelo que há a Estética da Arte, as estéticas dos indivíduos e as estéticas dos ofícios.

 

2

Estética, este livro, aplica, fundamentalmente, o Método Indutivo na análise da Arte, da Estética e da Obra de Arte. O Método Dedutivo, anterior a Descartes e ao racionalismo, parte duma verdade absoluta, Deus, para, partindo dela, deduzir como verdade todas as outras. Por essa verdade metafísica o universo foi uma criação de Deus, o homem foi uma criação de Deus, a Arte foi uma criação de Deus e a Obra de Arte, é uma criação de Deus; por essa relação dedutiva Platão, nas origens da Estética, concluiu que a Obra de Arte era inalcançável pelo duplo afastamento sensorial, entre o objeto imitado e a sua imitação: fantasia que vem desde há cerca de 2400 anos e que Estética nega pondo a Obra de Arte no seu lugar criativo, alcançável, do racional. No Método Indutivo a dúvida sobre uma realidade leva-nos à sua análise experimental e à certeza da realidade que lhe é subjacente: e assim sucessivamente conforme a cadeia das coisas relacionadas. Pelo Método Indutivo este livro analisa o que é a Arte e a Estética desde as suas origens concluindo o que as dirige em cada momento histórico até ao presente: a Arte Moderna depois de cerca de 170 movimentos artísticos vindos desde 1848, da Escola de Barbizon. É a análise do andamento histórico que nos diz o que  é a Arte e a Estética em cada momento contra a classificação ditada, ou deduzida, pelo agente artístico como substituto da verdade absoluta.  

 

 

 

3

Um indivíduo adquire um objeto, uma forma, uns sapatos, um casaco, uma cadeira, levado pelo seu gosto ornamental, a ideia de beleza que satisfaz o seu dia a dia. Como os gostos variam multiplamente de uns para os outros há uma dispersão incalculável de formas de calçar, de vestir e de mobilar contornando uma dispersão equivalente de gostos, de formas e de belos: isso na análise do indivíduo, ou do gosto, para o objeto, ou forma. Analisando opostamente, partindo da forma, há uma dispersão enorme de ofertas de sapataria, de vestuário e de mobiliário, para satisfazer todos os gostos: há, consequentemente, uma estética associada a cada variante ornamental, ou a cada ofício. Há a estética do mobiliário, há a estética da arquitetura, há a estética da chapelaria e por aí fora, sem restrições. Na Arte os gostos também se dividem: há quem só goste de arte abstrata, há quem só goste de arte clássica, há quem só goste de arte naif e há quem só goste de arte figurativa, com essa dispersão dos gostos, das formas e dos belos negando a racionalidade disciplinar da Arte: o que nos diz que é a Estética que dirige os gostos e não os gostos que dirigem a Estética, na Arte. Se é a Estética, a disciplina da Arte, que dirige os gostos artísticos ela tem um só gosto: o Gosto. Se é o Gosto da Estética que dirige as suas formas estas centram-se numa só forma: a Forma. O Gosto e a Forma da Estética determinam o seu Belo. Assim que o Gosto, a Forma e o Belo são da Estética e o gosto, a forma e o belo são das estéticas, individuais e dos ofícios. A Forma, o objeto artístico, ou Obra de Arte, é exclusiva da Arte; o Gosto, um só na multiplicidade de criadores artísticos, é da Estética; o Belo, obtido da apreciação da Forma pelo Gosto, é da Estética: é a sensibilidade associada ao Gosto e ao Belo depois da Forma que faz da Estética a Entidade (disciplinar) da Arte. O Gosto da Estética, que determina a sua Forma e o seu Belo, é o Gosto ditado pela Vanguarda do seu momento: a Vanguarda, que dirige o Gosto para o Gosto e o Belo para o Belo seguintes, une a Arte à Estética determinando o que é a Obra de Arte na Arte Moderna: porque a noção de Vanguarda nasceu com a Arte Moderna, pela Escola de Barbizon, em 1848.

 

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Se as estéticas são muitas, múltiplas e variadas, contornando os indivíduos e os ofícios, e a Estética é única, da Arte, na pirâmide social as estéticas são do seu corpo e a Estética é do seu vértice: da vanguarda de cada momento histórico, artístico e social: porque, muito embora muitos indivíduos sejam indiferentes à Arte, é ela que nos dirige partindo da arte do sentir, do olhar e do fazer. Isso diz-nos que as estéticas são da dispersão, da diversão humana, e a Estética é da sua direção, da razão social. Uma direção distinta da política: uma vez que esta se dispersa por fações partidárias de esquerda, do centro e de direita repartidas por interesses associados, empresariais, ideológicos e religiosos, cada um com a sua estética, enquanto a Estética é única. Interpretar a Estética parte da interpretação do Gosto, da Forma e do Belo, do modo como se isolaram das formas, dos gostos e dos belos da irracionalidade ornamental para a racionalidade disciplinar, ou da dispersão para a unicidade.