IX O PONTO NÚMERO 9 DA ESTÉTICA. A VANGUARDA I DA ARTE. ANDAMENTO DA ARTE E DA ESTÉTICA ENTRE 1848 E1900
Em 1848 um grupo de pintores instalou-se numa pequena vila dos arredores de Paris, Barbizon. Tinham por objetivo romper com a arte clássica e académica e manifestar o seu amor pela Natureza pintando-a diretamente. A atração pela Natureza inspirara-se nas paisagens de Jonh Constable, pintor romântico da variante naturalista (a outra variante romântica foi a libertadora, ou revolucionária, exemplificada em A Liberdade Guiando o Povo, de Eugène Delacroix). 1) Se a arte clássica e académica exigia um esboço prévio e a pintura executada a partir dele no estúdio os pintores de Barbizon pintaram sem esboço, diretamente, no Bosque de Fontainebleau. 2) se a arte clássica e académica levava para o exterior o bloco e o lápis para a execução do e prévio os Pintores de Barbizon passaram a levar o cavalete, as tintas e os pincéis. 3) Se a arte académica e clássica exigia a mistura das tintas na paleta os Pintores de Barbizon desobedeciam a essa regra misturarando-as diretamente na tela. 4) As pinturas de Barbizon privilegiavam a Natureza, contra o uso académico e clássico, onde ela era invariavelmente o plano de fundo, no retrato, nas cenas bíblicas, históricas, mitológicas e de género. 5) A Escola de Barbizon rompeu com o conceito clássico de Escola. A unificação da neocrítica primária com a defesa da Natureza, a negação da arte clássica e a escola livre criaram a Vanguarda I em 1848 na Escola de Barbizon. (VI)
Em 1848, na convergência da neocrítica primária e da negação do artificial, no ponto 9 da Estética, nasceu a Vanguarda I: como o que vai à frente na Arte. A Arte, e a Estética, em 1848, foi ao encontro da razão iluminista e moderna centrada no Contrato Social: tanto Hobbes, como Locke, como Rousseau, defenderam a lei humana como a continuidade da lei natural; e em Rousseau na Escola, a base do desenvolvimento humano, do Contrato Social e da democracia, Emílio aprende naturalmente estimulado para a aprendizagem.
A pintura da Escola de Barbizon foi inspirada na pintura de John Constable (1776/1837). John Constable viveu em pleno período da Revolução Industrial e urbana (1760/1830) e em vez de enfatizar a paisagem urbana, da onda corrente, enfatizou a paisagem natural; os pintores de Barbizon, já em plena era moderna, com os grandes centros industriais e urbanos e com a febre romântica de liberdade pintaram o Bosque de Fontainbleau em vez de Paris, efervescente de cor, de contraste e de gente. Os Pintores de Barbizon, franceses e estrangeiros atraídos pela febre da cidade da Arte, Paris, saíram para os arredores por uma atração maior, a Natureza, e o bosque de Fontainebleau, na vila de Barbizon. Se John Constable, um só pintor, sentiu o encanto natural na ascensão social os pintores de Barbizon, muitos, uma Escola, fixaram esse encanto determinando a Natureza sobre a Natureza Humana: na Arte e na Estética. Com a inspiração direta na Natureza a Natureza sobrepôs-se à Natureza Humana na representação artística. Essa sobreposição contrariou o domínio da Natureza Humana sobre a Natureza vinda do pensamento clássico e da arte associada. Essa contrariação foi outro fator determinante da Vanguarda I: quando a ideia de Vanguarda depende de fatores sensitivos gerais, do andamento da Arte e da Estética, e não de pormenores localizados, práticos, de um artista ou de um movimento, ou ideológicos, de um crítico.
Em 1848, com a Escola de Barbizon, ocorreu o ponto número 9 da linha da Estética pela inversão da dominante sensitiva na Arte: antes o pensamento partia do domínio do homem (criado por Deus e por ele protegido: pensamento dedutivo) sobre o que o rodeava; depois o pensamento partiu do domínio da Natureza sobre o homem (que obedece racionalmente às suas leis: pensamento indutivo vindo do iluminismo). Com essa transformação fundamental, por ser do pensamento, ideológica, sensitiva e da perceção (variantes que vinham desde Platão), nasceu um novo rumo na linha da Estética. E associaram-se mais dois fatores essenciais: 1) Com a elevação da Natureza à Natureza Humana a Arte negou, implicitamente, o impacto negativo da atividade industrial no Ambiente; negou os efeitos negativos da evolução científica: negação essa que foi impressa no manifesto do movimento Arts & Crafts, da década de 1880, e foi transversal a muitos outros dos quase 190 movimentos da Arte Moderna; 2) Sendo a Escola de Barbizon uma escola sem regras académicas 1848 rompeu com a classificação de Baumgarten que restringia a Obra de Arte às disciplinas de Belas Artes. A importância da escola Livre contra a escola Clássica na criação da Vanguarda I está correta porque todas as transformações fundamentais da Arte Moderna, como o Impressionismo, o Cubismo, o Expressionismo e o Dadaísmo nasceram alheias ao meio académico, às Belas Artes da Estética de Baumgarten: por isso em 1848, com a Escola de Barbizon e a origem da Arte Moderna, nasceu uma nova Estética: a Estética da Arte Moderna. (EAM)
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Se antes de 1848 o pensamento era dedutivo, da dependência de Deus, o indutivo, seguinte, passou a ser da dependência da Natureza. Dependemos da Natureza e não de (D)deus. Tudo centrado no útil. No andamento humano o geral, da espécie, sobrepõe-se, incontestavelmente, ao particular. Em cada momento urge sobre a sobrevivência do indivíduo, dirigida pelos avanços científicos centrados na Medicina, a sobrevivência da espécie, centrada na defesa da Natureza contra a crise ambiental. A espécie sobrepõe-se ao indivíduo: no útil. Se (D)deus é útíl a muitos homens, de diversas religiões, na superação dos seus problemas particulares, (E)ele não é útil à espécie que tende a sufocar ambientalmente arrastando os crentes e os não crentes: também por isso, mas mais porque a Natureza é a mãe, temos a Natureza sobre deus. E a Arte, em 1848, deu o passo, da Vanguarda I e do ponto 9 da Estética, da sobreposição da Natureza a deus que se vinha desenhando desde a origem do Renascimento pelo pensamento, na literatura e na pintura, por Giotto: ela com letra grande, porque a espécie depende dela, e ele em letra pequena porque a queda no caos é indiferente a deus. E o útil, na Arte e na Estética, passou a ser genérico e não do indivíduo: por isso o Esteticismo, um movimento transversal de 1868, negou a Arte orientada por razões particulares e defendeu a Arte sintetizada na Arte, de uma só razão: que não pode ser outra senão a da Natureza sobre deus.
A Escola Livre contra a escola tradicional foi uma crítica à direção
anterior da Arte e da Estética; a negação aos métodos clássicos foi uma crítica
à representação artística vinda desde a imitação de Sócrates; e a sobreposição
da Natureza à Natureza Humana foi uma crítica ao homem problemático, com ele
próprio e com o meio envolvente: foi uma crítica ao homem artificial. Nas três
variantes temos a palavra Crítica. Na terceira é a crítica ao homem artificial:
da poluição, da guerra e da desigualdade. As outras duas podem também
enquadrar-se na crítica ao artificial: porque a imitação, a base da arte
clássica, é uma falsificação da realidade, a forma natural representada
artificialmente; e a Escola Livre é a crítica, e a fuga, pela Arte, ao
aprisionamento do homem. Podemos concluir que o ponto 9 da estética e a
Vanguarda I foram dirigidos pela crítica ao artificial: a crítica ao homem
genérico sobre o homem individual. A crítica ancestral ao dogmático, que
refreou no Neoclássico e no Romantismo, foi substituída na Arte Moderna pela
Crítica ao Artificial.
O Gosto em 1848 foi sensibilizado pela negação do artificial ou elogio da Natureza. Os pintores de Barbizon levados pelo Gosto foram para o Bosque de Fontainebleau para o representar como o viam. A Forma transitou da formas clássica, onde a Natureza era o plano de fundo, para a Forma moderna, onde a Natureza é plano principal. Cada parte do bosque pintada representou uma Forma da Natureza marcada pela emotividade do executante. O Belo de cada obra residia na ligação emocional do Gosto à Forma. A emoção artística abandonou o impulso metafísico e libertador e fixou-se na ligação visceral do homem à Terra. Esta nova emoção orientou as pulsações iniciais da Arte Moderna. O Gosto na pintura de Barbizon foi do gosto pela pintura ao ar livre, da Natureza: livre das regras académicas, clássicas e limitadas pela Estética de Baumgarten. A Forma foi a forma da paisagem natural transmitindo as emoções da Natureza ao homem. O Belo foi o belo da Natureza sobre o belo da Natureza Humana.
Na dispersão sensitiva, do Belo e do belo, dos diversos movimentos seguintes a 1848, quando é que o Belo passou a dominar transversalmente sobre o belo na evolução da Arte? Essa transição demarcou um segundo ponto da Estética Moderna: o ponto número 10 da linha da Estética: porque foi a reafirmação da crítica ao artificial, equivalente ao elogio da Natureza, vinda da Escola de Barbizon. Se a Escola de Barbizon, individualmente, um movimento, colocou a Natureza no foco central da Arte o ponto 10 da Estética fixou essa colocação pelo apuramento coletivo seguinte a 1848. Com o ponto 10 da Estética nasceu a Vanguarda II. O Belo determinou-se efetivamente sobre o belo no Primitivismo simultâneo à Escola Moderna de Paris de 1900. Pelo estudo dos movimentos seguintes a 1848 compreendemos a conversão dada em 1900. Ocorreram cerca de 38 movimentações artísticas: movimentos, correntes, associações, clubes e secessões: a que chamo, simplificando, movimentos.
1848: Escola de Barbizon. 1848: Ponto número 9 da Estética. 1848; Vanguarda I. 1868 Esteticismo. 1870: Arte Kitsch. 1872: Impressionismo. 1850/1900: Realismo. 1878: Cubismo Cezanniano. 1882 Arts Inchoérents. 1884: Société des Artistes Indépendants. 1885: The New English Art Club. 1885: Pós-impressionismo.1880/1900: Decadentismo. 1880/1900: Arts & Crafts. 1880/1900: Pintores de Skhagen. 1886: Simbolismo. 1886: Escola de Pont-Aven. 1886: Neo-impressionismo. 1886: Arte Naif. 1886: Pontilhismo. 1888: Sintetismo. 1888: Cloisonismo. 1890: Les Nabis. 1892: Secessão de Munique. 1892: Linked Ring. 1893: Expressionismo. 1890/1900: Arte Nova. 1890/1900: Pictorialismo. 1890/1900: Modernismo. 1896: Jugendstil. 1897: Secessão de Viena. 1898: Jovem Polónia. 1898: Secessão de Berlim. 1898: Mundo da Arte. 1899: Darmstadt. 1900: Primitivismo. 1900: Vanguarda II. 1900: ponto 10 da Estética.
Houve movimentos insignificantes: acríticos que pouco, ou nenhum, significado tiveram no andamento da Arte. Houve movimentos com significado: que interferiram de algum modo no andamento da Arte ou que se impuseram como estilos autónomos no tempo. E houve movimentos significantes: críticos e determinantes no andamento da Arte e da Estética. Isso na relação direta com a Arte; indiretamente, em seguimento da liberdade representativa e crítica da Escola de Barbizon, ocorreu a negação (fundamental ao progresso da Estética) à arte clássica, académica e convencional: negação transversal a movimentos significantes, com significado e insignificantes que dificulta a separação dos seus níveis de importância. São exemplos as associações expositivas, como o The New English Art Club, de 1885. Exigindo a liberdade expositiva para todos não foi esteticamente crítica; mas negou, a favor do novo, a obstrução expositiva associada à arte clássica, académica e conservadora: misturando os critérios de classificação insignificante, com significado e significante.
A Vanguarda I, associada à Escola de Barbizon, em 1848, surgiu como o que vai à frente, na Arte. Não existindo vanguardas antes a Estética como que não se definia linearmente em cada período: seguia as oscilações dos avanços clássicos. Enquanto as transformações artísticas obedeciam aos avanços técnicos e plásticos a crítica só obedecia a si mesma: como uma razão estética, ou sensitiva, subjacente a todas as transformações práticas. Na separação da Arte Moderna da Arte Clássica à Vanguarda I esteve implícita, vinda do Iluminismo, do Romantismo e, revolucionariamente, da Queda da Bastilha e da Revolução Francesa, a reivindicação da igualdade social como uma aspiração da Arte. Essa aspiração foi negada pelo Esteticismo, de 1868, embora seguisse dispersamente até 1900. Como a Estética é a disciplina da Arte a reivindicação social negada transversalmente, de modo sensorial e não plástico, pelo Esteticismo, foi excluída da Arte.
Se a Escola de Barbizon foi um passo plástico (contrário à técnica clássica) em frente ele necessitava de um apoio ideológico, ou sensitivo: o Realismo, entre 1850 e 1900, e o Esteticismo, de 1868, criaram esse apoio de condução à Vanguarda II. As transformações clássicas eram impulsionadas pela crítica e o primeiro avanço moderno foi acompanhado do respeito pela natureza, um impulso ideológico: logo pela crítica porque ideia é crítica. Se 1848 foi o momento da transição do clássico no moderno nele o gosto transformou-se em Gosto. O gosto clássico que chegou a 1848 necessitava da ideia, da crítica, para subir a Gosto. Antes de 1848 a crítica era exclusiva da Arte enquanto a Estética se dissolvia pelas variantes das Belas Artes, sem crítica, ou com crítica; Em 1848 a Arte tornou-se crítica do artificial: como a Arte é dirigida pela Estética esta passou a ser dirigida pela crítica ao artificial. O acompanhamento das transformações práticas por transformações sensitivas ocorreu na evolução da Arte e da Estética como ocorreu na evolução do homem: a separação da linhagem humana do macaco Rhesus, há cerca de 25 milhões de anos, foi precedida pela origem da Linguagem Articulada e da distinção da comunicação antropológica da comunicação animal; a transição do quadrúpede no bípede, há cerca de 6,4 milhões de anos, foi precedida pela descoberta do Verbo essencial à conversão do Tropo na Palavra e da Linguagem Articulada na Linguagem Moderna; a transição da Barbárie na Civilização, há cerca de 8000 anos, foi acompanhada da conversão dos sinais artísticos, do segmento final da Arte Rupestre, nos signos literários e numéricos da origem da Escrita e da Matemática. A Arte Rupestre, de há cerca de 90000 anos, deu-se pela associação da verticalidade com a sensibilidade artística inicial. Como uma exigência antropológica a razão ideológica acompanhou a evolução da Vanguarda I. Seguindo essa razão ocorreram: as secessões de Berlim, de Viena e de Munique e os orientadores transversais, o Esteticismo, o Sintetismo; e o Primitivismo da origem da Escola Moderna de Paris, de 1900, da Vanguarda II da Arte e do ponto 9 da Estética.
Todas as movimentações reivindicativas do
novo contra o velho na Arte participaram na evolução artística: porque
intervieram ideologicamente no andamento estético. As secessões e associações,
de grupos de artistas localmente estabelecidos, derivou de movimentações gerais
ou originou-as, como o Esteticismo, o
Sintetismo, o Modernismo e o Primitivismo, no sentido duma vanguarda para a
seguinte. O Esteticismo, de 1868, nasceu 20 anos depois de apenas 3 movimentos,
de 1848, a Escola de Barbizon, a Vanguarda I e o ponto 9 da Estética: sem pressão
o Esteticismo nasceu da necessidade da Arte concentrar-se na Arte, duma
Estética limpa do alheio contido na Vanguarda I. Contudo, entre 1850 e 1900,
simultaneamente ao Esteticismo mas sem data de início precisa, ocorreu o
Realismo.
O Realismo foi uma orientação artística lateral a todas as transformações artísticas entre 1850 e 1900. Negou a subjetividade a favor da objetividade na Arte. Uma objetividade ativista, social e politizada vinda do Romantismo e adotada pela vanguarda I. Quis a representação fidedigna da realidade depois da primeira fotografia em 1826 (por Joseph Niépce e da primeira câmara fotográfica em 1839 (por Jacques Daguerre) com a imitação entregue à máquina fotográfica que evoluia a passos rápidos. Negou o elitismo clássico a favor do classicismo popular centrado nas exigências sociais. Por sua vez o Esteticismo, de 1868, negando tudo que era alheio à Arte, como a reivindicação social vinda da vanguarda I e do Romantismo, entrando em conflito com o Realismo durante 32 anos, defendeu a Arte sintetizada na Arte.
A elevação da forma à Forma do Cubismo (1878: Cubismo Cezanniano antes do Cubismo de Picasso e Braque), a sintetização simbólica da Obra de Arte exigida pelo Simbolismo que levou da forma do sinal à Forma do signo, conduziu ao Sintetismo de 1888. O Sintetismo defendeu a representação reduzida ao mínimo de pormenores e foi fundamental a todo o andamento posterior, de queda da objetividade na subjetividade, ou da imitação na abstração: ou da forma plástica na Forma sensitiva, ideológica e crítica. O Cubismo e o Simbolismo foram movimentos artísticos e o Sintetismo foi uma orientação de movimentos. A seguir ao Sintetismo, ou em simultâneo porque também de 1888, surgiu o Cloisonismo, que conduziu a forma tradicional, com contornos indeléveis, com contraste claro e escuro, com profundidade, todos da aprendizagem clássica, à Forma moderna, com contornos espessos e negros, com áreas planas de cor, sem perspetiva: da arte livre e contrária à da aprendizagem académica. O Modernismo, de1890/1900, mas muito provavelmente imediatamente seguinte a 1893 de O Grito, concentrou todas as tendências orientadoras vindas do Esteticismo associando-lhes mais uma: a força expressionista de Edvard Munch. Foi a agressividade representativa do homem contra a Natureza, lateral à linha contra a agressão da guerra, de O 3 de Maio de 1808 (1814) de Francisco de Goya e de A Carga dos Marmelucos de Edouard Manet (1868), que levou da Vanguarda I à Vanguarda II e do ponto 9 ao ponto 10 da linha da Estética, em 1900.
A Vanguarda II e o ponto 10 da Estética foram alheios à crítica à besta humana associada à guerra mas tiveram os seus alicerces na crítica ao homem artificial, alienado sob a Natureza, do Expressionismo recém-nascido e que veio dominar toda a arte futura. Com a Vanguarda II e o ponto 10, em 1900, nasceu a Escola Moderna de Paris como o campo de evolução seguinte da Arte e da Estética. Na Escola Moderna de Paris dominou a crítica ao artificial com a crítica à guerra, e à arte clássica, em estado latente, porque se vieram a manifestar depois: com o Cubismo de Picasso depois de 1907 das Demoiselles d’Avignon e do Dadaísmo de 1916; e da negação da arte retiniana de Marcel Duchamp de 1915.
Arte não é arte. A arte é decorativa e a Arte é crítica. A Arte é da Estética, alinhada nos movimentos Significantes; e a arte é dos movimentos com significado e insignificantes, desalinhados da Estética. O Impressionismo com a impressão, ou sensibilidade, sobre o visual, e o Expressionismo, com a expressão sobre a impressão, foram críticos e alteraram o rumo da Arte e da Estética: foram significantes. A Arte Nova, um grande movimento transversal a diversas disciplinas, da beleza floral e decorativa, não foi crítico e não alterou a direção da Arte e da Estética: mas persistiu como movimento no tempo e no mundo: foi com significado. O Kitsch e o Naif foram decorativos no ingénuo e acríticos que persistiram lateralmente à Arte e à Estética.
O Kitsch (1870) foi artisticamente nulo, ou insignificante; mas não foi esteticamente nulo: porque a sua génese, a não-Arte (não nos termos seguintes a 1900: de Marcel Duchamp e do Dadaísmo, mas nos termos banais, mesmo do corriqueiro sobre o ornamental) querendo passar por Arte na Escultura, originou, uns 70 anos depois, na chamada Arte Contemporânea, o Neokitsch e o Neoneokitch. O Naif (1886) foi um movimento para a análise dupla: em si a arte Naif foi da representação básica, ingénua, garrida, demasiado pormenorizada e sem criatividade artística, da paisagem popular; mas de si, da sua plasticidade, nasceu a simplicidade formal que deu origem a correntes fundamentais da Arte Moderna, como o Impressionismo, o Expressionismo e o Fauvismo, transversais ao Primitivismo da conversão da vanguarda I na Vanguarda II. O Arts & Crafts (1880/1890), reivindicativo da elevação do Artesanato a Arte, não foi um movimento esteticamente nulo: só porque alertou para o problema da poluição industrial. O primeiro alerta artístico da crise ambiental deu-se com o Arts & Crafts, na Arte Moderna, quando a denúncia da impiedade humana para com os animais se deu com Caravaggio, na Arte Clássica, no dente partido do pente de Maria Madalena, cerca de 200 anos antes: com a denúncia e o alerta na linha crítica que veio até ao presente. A defesa do Ambiente pela Arte, oficializada no segmento final da Estética na Arte Crítica de 2019, foi sinalizada no Arts & Crafts entre 1880 e 1890. O Artes Incoerentes (1882) defendendo a arte infantilizada e o mal desenhado como Arte preconizou variantes do expressionismo figurativo: como de Pablo Picasso (1907), do CoBrA (1948) e da Arte Bruta (1945) de Jean Dubufet. O Impressionismo (1872) foi um movimento fundamental porque imprimiu à Arte a impressão sobre o real; quando foi a impressão que precedeu o expressionismo, da expressão crítica, dos sentidos sobre o plástico. Paul Cezzane, com a primeira pintura do Monte de Santa Vitória (1878), criou o Cubismo Cezanniano muito antes do Cubismo Analítico e do Cubismo Sintético de Picasso e de George Braque; Paul Gauguin (1848/1903), reduzindo a forma a áreas planas de cor delimitadas por traços espessos negros, preconizou o Sintetismo (1888) e o Cloisonismo (1888) essenciais ao andamento da Arte Moderna e da negação clássica; e o Pontilhismo (1886) de Jeorge Seurat (1859/1891) reduziu a Pintura ao sintetismo mais puro, com os pontos complementares, ou o ponto, no limite das formas geométricas fundamentais dos outros movimentos geométricos. O Cubismo Cezanniano, a pintura de Gauguim e o Pontilhismo, como alterações geométricas da realidade nascidas no Impressionismo, originaram as correntes geométricas do século XX: o Cubismo Analítico (1907), o Cubismo Sintético (1911), o Suprematismo (1916) e o Neoplasticismo (1918). A Arte Nova (1890/1900) demarcou na originalidade floral o decorativo transversal a diversas áreas estéticas e à Estética ao mesmo tempo que, sem crítica, elegeu as formas da Natureza contra as formas artificiais. O Linked Ring (1892), contrariamente ao Pictorialismo (1890/1900) que manipulava a fotografia para a elevar a Arte, defendeu a Fotografia como Arte. O Darmstadt (1899), transversal a diversas áreas incluindo a Arquitetura, preconizou a a (1919) defendendo a Arte útil, ou arte funcional, a favor da felicidade pública e contra o elitismo urbano, artístico e institucional (interesses laterais à síntese da Arte na Arte imposta pelo Esteticismo (1888) no percurso do ponto 9 para o ponto 10 da Estética).
O Simbolismo (1886) preconizou a Arte Concetual (não do que se concebe e sim da abertura à conceção ideológica, e crítica, dos outros) do Expressionismo Abstrato: na defesa da Obra de Arte aberta ao olhar dos observadores; na exigência da subjetividade na análise da Obra de Arte; na defesa da dispersão analítica da Obra de Arte conforme a dispersão analítica dos observadores; e na defesa da dispersão analítica da Obra de Arte pela sua dispersão simbólica, do seu sinal dinâmico, não estático, ou signo. O Les Nabis (1890) seguiu todas as exigências modernas contrárias ao conservadorismo e defendeu a Arte como A razão da busca humana. Jovem Polónia (1898), em conformidade, defendeu a Arte como valor superior da transformação humana. A Société des Artists Indénpendants (1884) negou a Estética clássica, de Baumgarten, a favor de uma nova Estética: na linha da crítica da Arte Moderna vinda de 1848. Defendeu, pela liberdade expositiva, a exibição artística sem júris de seleção e sem prémios; pormenor só comum ao Versatilismo (2008). O clube expositivo The New English Art Club (1885) (que chegou até hoje como The London Group) foi contrário ao conservadorismo que só expunha a sua elite. A negação do conservadorismo artístico, clássico e académico, contrário à Estética, desse clube, da maioria dos movimentos e da totalidade das tendências, adquiriu a sua forma máxima nas secessões: três no século XIX e duas no século XX. A Secessão de Munique (1892), de Viena (1897) e de Berlim (1898), liderando as reivindicações ideológicas fundamentais ao progresso artístico negaram a arte clássica, académica e instituída, afirmando o novo contra o velho no segmento final da transição para a vanguarda II. A força sensitiva das secessões jogou com o Modernismo (1890/1900) na defesa da subjetivação da realidade contra a imitação clássica e académica: e na convergência na escola Moderna de Paris de 1900. O Pós-impressionismo (1880/1900) negou a emotividade total do Impreessionismo e trocou as cenas da Natureza pelas sociais. O Neo-impressionismo (1886) seguiu o Pós-impressionismo trocando as cenas sociais pelas do convívio boémio e seguiu os métodos de Paul Gauguin. O Decadentismo (1890/190) foi um movimento sobretudo literário. Na pintura usava uma simbologia clássica transparecendo inquietação, pesar, distúrbio emocional, tristeza e ceticismo, numa crítica aos valores sociais vigentes. Negava a abertura concetual simbolista da Obra de Arte defendendo-a como imagem exclusiva de quem a produziu. Os Pintores de Skagen (1890/1900) seguiram os de Barbizon simpatizando com a pintura ao ar livre. A Escola de Pont-Aven (1886) foi um marco fundamental no avanço da Arte Moderna. Foi uma colónia artística espontânea em Pont-Aven, Bretanha, França, de jovens artistas simpatizantes sobretudo do Impressionismo em cenas do romantismo rural. A colónia artística de Pont-Aven, depois da Escola de Barbizon, marcou o oposto da escola académica a que a maioria esmagadora dos movimentos se opuseram. O Jugendstil (1896) foi um movimento sobretudo tipográfico de tendência revolucionária. Adaptou os caracteres tipográficos à Arte Nova, ou inversamente, indo do decorativo ao agressivo, da forma e da cor, ao sabor da temática a transmitir. O Mundo da Arte (1898) foi um movimento que à imagem de todos os movimentos russos posteriores quis adaptar as tendências principais da arte ocidental à sua arte tradicional: do popular, do folclore e dos ícones. Negou o conservadorismo vigente nas artes.
Todas as exigências e adiantamentos da Arte Moderna nesse período mostram que a sua evolução não foi linear: o caso máximo foi o nascimento do Expressionismo por um caso isolado na Pintura: O Grito, de Edvard Munch, de 1893, 6 anos antes da vanguarda II, 17 anos antes do expressionismo cinematográfico (1910) e 27 anos antes do Expressionismo Alemão (1920). Da Vanguarda I para a Vanguarda II o que a Arte apurou foi o que foi em frente; da Vanguarda I para a Vanguarda II o que a Estética apurou foi a arte crítica: da crítica de O Grito de Munch depois da crítica à poluição industrial do Art & Crafts e da crítica naturalista de Barbizon, da expressão sensitiva sobrepondo-se à impressão impressionista.
O Modernismo geométrico negou a representação clássica da sombra, profundidade e perspetiva reduzindo-os, sensitivamente, ao sintetismo da cor, linha e planificação. Embora O Grito de Munch não seja uma planificação ela carece das regras tradicionais de perspetiva e profundidade: não obedece por completo ao modernismo geométrico mas aproxima-se muito dele. As figuras, a principal e as outras duas, são desfigurações grosseiras: desobedecem, simplesmente, a qualquer regra do desenho hábil. O céu é vermelho e amarelo, sem sinal do azul comum: quando o azul domina o resto do quadro. Oslo e a Doca de Oslo separam-se perfeitamente do céu pelo contraste do vermelho e amarelo com o azul. Não há uma profundidade clássica distanciando o céu, Oslo e a Doca de Oslo, a montanha e a ponte com as três figuras. A montanha à direita é azul como Oslo e a Doca de Oslo: o que os distingue são a disposição horizontal de Oslo e da Doca de Oslo e a disposição transversal e curva, à direita e ao fundo entre o céu e a Doca de Oslo, da montanha. Mas, no conjunto, o céu, Oslo e a Doca de Oslo, estão pintadas no mesmo plano, sem profundidade, sem um ponto de fuga, que os distinga efetivamente. Mas essa profundidade existe: o que a provoca é o corte, da direita para a esquerda, da ponte: não uma ponte clássica (1893) mas uma ponte com resguardos metálicos vulgares e modernos. Os traços das cantoneiras da ponte funcionam como os traços espessos e negros da planificação do Sintetismo Geométrico.
Edvard Munch escreveu que O Grito é o grito da Natureza: nós, observadores, vemos que a figura significante grita um grito absurdo e podemos concluir que se trata do grito da alienação humana independente da Natureza: mas somos obrigados a seguir o que disse o autor. O grito de O Grito, que bloqueia os ouvidos para não se ouvir, é o grito da pequenez humana perante a grandeza da Natureza que o envolve: será a reação à transformação ambiental e ao perigo envolvente. A agressão da cara e das cores e a obsessão formal do conjunto transmite alienação, opressão, angústia, medo e finalmente: crítica. A alienação, a opressão, a angústia e o medo são emanações diretas, objetivas, do quadro para quem o olha; a crítica vem da observação analítica, do ver sobre o olhar do observador: O Grito abre-se concetualmente ao olhar e à crítica. Uma crítica contra o homem que transforma matéria inerte em energia, calor e fumo que liberta para a Natureza onde respira e pode sufocar. Uma crítica do Concetual da Estética díspar do Concetual da Arte: se o concetual da Arte é do que se concebe artisticamente, da exclusividade criativa do autor, o Concetual da Estética soma à criatividade artística a abertura criativa, e crítica, do ver do observador. A Estética, do sensível, dirige a Arte, também do sensível, mas por uma sensibilidade dupla, com o observador, ou os observadores, da Obra de Arte, ampliando a sensibilidade do um em direção ao todo. É esse alargamento progressivo que admite o olhar crítico: ou ver duchampiano de duas décadas depois, já em plena Vanguarda II.
O Grito foi um quadro crítico do homem moderno, industrializado, bélico e poluente, de 1893. A evolução moderna da arte anterior foi crítica da arte conservadora, clássica e académica: crítica que se concentrou, na década de 1890, nas secessões artísticas: a Secessão de Munique em 1892; a Secessão de Viena em 1897; e a Secessão de Berlim em 1898. As secessões concentraram o papel reivindicativo, do sensível e ideológico, das transformações artísticas modernas; e o expressionismo de O Grito foi crítico, do sensível e do ideológico: e como que deu azo à intensificação reivindicativa das secessões e à conversão do ponto número 9 no número 10 da Estética..
Da Vanguarda I para a Vanguarda II, entre 1848 e 1900, ocorreram 38
movimentos. Nesses 38 movimentos 20 foram exclusivos da Pintura: 20/38=53%. 14
incluíram a Pintura e outras áreas: 14/38=37%. A Pintura entrou em 20+14=34
movimentos: 34/38=89%. A transição do ponto 9 para o ponto 10 da Estética foi
dominado, quase em absoluto, pela Pintura. Nos 38 movimentos 31 negaram a arte
conservadora, académica, elitista, paternalista, clássica e instituída:
31/38=83%. A transição do ponto 9 para o ponto 10 da Estética negou,
maioritariamente, a arte académica. Se a transformação estética, da Arte
Moderna, ou do ponto 9 para o ponto 10 da Estética, foi da forma a Forma e do
belo a Belo pelo domínio plástico da Pintura o gosto foi a Gosto pela ação
transformadora dessa disciplina: a Pintura. Como é a transformação do gosto em
Gosto que dirige as transformações artísticas, a forma em Forma e o belo em
Belo, a crítica pela Pintura, de uma só das quatro disciplinas agregadas por
Baumgarten à Obra de Arte, fixou essa disciplina como líder na Vanguarda II e
no ponto 10 da linha da Estética.
A Vanguarda II ocorreu em 1900. Seguiu a ideia do Esteticismo: a Arte pela
Arte. Negou a politização da Arte e a objetividade da Vanguarda I e do
Realismo. Negou a arte instituída pelas academias e pelas instituições conforme
a Vanguarda I, o Modernismo, o Realismo e o Esteticismo: as quatro
movimentações gerais orientadoras das transformações artísticas da Arte Moderna
no século XIX e da Estética no segmento entre o ponto 9 e o ponto 10. Negou o
pré-estabelecido e defendeu o experimentalismo e o anti-tradicional: vindos dos
movimentos dominantes. E agregou a si, e à Estética, pelo domínio da Pintura na
direção dos movimentos, essa disciplina: abandonando as outras três, e todas as
outras, às suas estéticas.
A distribuição geográfica dos 38 movimentos precedentes da Vanguarda II e do ponto número 10 da Estética foram as seguintes. França 20: 20/38=53%. Inglaterra 6: 6/38=16%. Alemanha 5: 5/38=13%. Dinamarca 1: 1/38=3%. Noruega 1: 1/38=3%. Polónia 1: 1/38=3%. Áustria 1: 1/38=3%. Rússia 1: 1/38=3%. Europa 1: 1/38=3%. Nos 53% de movimentos nascidos em França contam-se quase todos os movimentos fundamentais: o Naif (como base primitiva dos outros movimentos), o Impressionismo, o Sintetismo, o Simbolismo e o Cloisonismo. O Expressionismo, a exceção, foi o único movimento fundamental nascido na Noruega. Se os movimentos fundamentais nascidos em França foram da sensibilidade geométrica e da crítica naturalista o Expressionismo foi também, ou essencialmente, da crítica do homem ao homem: um impulso que se previa mas que nasceu isoladamente, de Edvard Munch. O domínio francês dos movimentos originou a Escola Moderna de Paris em 1900.
A evolução da Arte Moderna foi a negação da arte académica. A arte académica era a arte transmitida pela técnica desde o tempo clássico: era a arte da Escola, ou Academia, de Belas Artes agregada à Estética por Baumgarten. As escolas, ou academias, de Belas Artes, existem hoje, existiram entre 1848 e 1900 e existiam antes: mas entre 1848 e 1900 a urgência de uma nova Estética e de um novo andamento artístico criou escolas livres, como a Escola de Barbizon e a Escola de Pont-Aven. E a liberdade das escolas livres fixou-se na Escola Moderna de Paris como centro transversal à evolução artística seguinte. A Escola Moderna de Paris não foi propriamente uma escola e sim um centro geográfico diretor da Arte e orientador das Escolas de Belas Artes. O termo moderna veio por dois motivos: porque a Escola de Paris já existia vinda de Paris como centro mundial das artes desde o tempo bizantino; porque a Arte Moderna, dominada pela França depois da Escola de Paris, só podia originar a Escola Moderna de Paris. E em 1900, em simultâneo com a Escola Moderna de Paris, nasceu o Primitivismo. O Primitivismo, como tendência orientadora plástica da Vanguarda II e da Escola Moderna de Paris, originou o Fauvismo em 1901. A intensidade agressiva da cor e do traço do Fauvismo, na negação da elaboração cromática e do contorno da técnica académica, como que orientou a Arte em direção à Vanguarda III.